A professora, escritora e ativista Bárbara Carine, de Salvador, tomou uma decisão firme e consciente logo no início de sua gestação: queria que o parto fosse conduzido exclusivamente por profissionais negros. Mais do que uma escolha simbólica, essa decisão foi uma estratégia de cuidado, proteção e segurança — tanto para ela quanto para seu filho.
“Cerca de 66% das mulheres que sofrem violência obstétrica no Brasil são negras. Isso reflete um processo histórico de desumanização que ainda persiste”, afirmou Bárbara, em entrevista à revista Crescer. Ela ressalta que, por séculos, mulheres negras foram associadas à ideia de resistência à dor, animalizadas e, muitas vezes, usadas como cobaias em experimentos médicos. Um exemplo citado é o médico americano Marion Sims, conhecido como “pai da ginecologia moderna”, que realizou procedimentos invasivos em mulheres negras, porto-riquenhas e haitianas sem anestesia e sem consentimento.
Diante desse histórico, Bárbara afirma que sua motivação foi centrada na segurança. “Não era apenas sobre representatividade ou sobre valorizar economicamente a comunidade negra — embora isso também seja importante. Era sobre proteger a mim mesma e ao meu filho.”
A decisão, segundo ela, foi planejada desde o início da gravidez. Militante do movimento negro, educadora e fundadora da primeira escola afro-brasileira do país, Bárbara já carregava essa preocupação em seu projeto de maternidade. “Essa ideia não surgiu do nada. Está ligada à minha trajetória, à minha atuação política e à consciência das estatísticas que atingem mulheres negras no Brasil”, explicou.
Com o apoio da família, ela estruturou uma equipe formada por médico, doula e enfermeira obstetra, todos negros. Para Bárbara, a escolha garantiu um ambiente de acolhimento e respeito. “Queríamos ser vistos como humanos. Eu queria ser tratada como mulher, como pessoa.”
Apesar de desejar um parto normal, Bárbara passou cerca de 13 horas em trabalho de parto e, por recomendação médica, foi submetida a uma cesárea. Ainda assim, considera a experiência profundamente positiva. “Mesmo com as mudanças no plano original, eu me senti muito cuidada. Foi tudo feito com atenção, carinho e respeito. Me senti gente durante todo o processo”, relembra.
O cuidado da equipe seguiu após o nascimento do bebê. Bárbara relata que, nas semanas seguintes, recebeu visitas em casa, fez consultas de retorno e segue sendo acompanhada. “Essa rede de apoio continua presente. Me sinto acolhida, amparada e segura com esses profissionais.”