Tortura de pretos contra pretos

Por: Zulu Araújo

Pense num absurdo, que a Bahia tem precedentes, afirmava o pitoresco Governador da Bahia, Octávio Mangabeira. Pois bem, essa semana a Bahia materializou essa célebre frase. Dois empresários negros (tio e sobrinho), Alexandre Carvalho e Diógenes Carvalho, torturaram de maneira bárbara, dois jovens trabalhadores negros, William de Jesus e Marcos Eduardo Serra, por suspeitarem deles terem roubado trinta reais ($30,00), numa de suas lojas. Acreditem, tudo isso aconteceu, por conta de trinta reais, em pleno Centro Histórico da Cidade do Salvador, com direito a filmagem ao vivo e divulgação nas redes sociais.

Um caso grave de violação de direitos humanos, um exemplo trágico do estado de barbárie no qual estamos inseridos. Isto porque, os dois jovens, não apenas foram espancados com socos, pontapés e pauladas, assim como um deles teve inscrito em suas mãos o número 171, (artigo do código penal que trata do crime de estelionato) com ferro em brasa, para que o mesmo carregasse para o resto de sua vida essa marca, igualzinho como se fazia com os escravos em passado recente.

O fato inusitado é que foram dois negros, torturando dois negros e a justificativa prosaica, tanto do advogado dos torturadores como dos autores do crime hediondo era que eles surtaram, mas apenas deram um corretivo, mas que eram gente de bem, com família constituída, além de trabalhadores. Argumento absolutamente igual aos utilizados pelos milicianos, racistas e membros da extrema direita brasileira quando praticam seus atos de barbárie. Ou seja, “Deus que me livre da maldade de gente boa”, como diria o cantor Chico César.

Esse fato deve servir de alerta, a todos aqueles que são ativistas da luta antirracista no Brasil, de que o combate ao racismo, não pode significar passaporte para o cometimento de barbaridades como estas sem que a punição seja exemplar, pouco importando nesses casos se os criminosos são brancos ou negros. Além disso, também é importante refletir sobre certa ingenuidade que tem circulado em diversas camadas e grupos do movimento negro brasileiro, particularmente entre os jovens, de que a cor da pele, no caso negra, já seria suficiente, por si só, para incorporar e exercer os princípios da igualdade, da fraternidade e da justiça.

Essa ingenuidade pode nos custar caro e de certo modo dificultar ainda mais a luta contra o racismo, visto que não há qualquer comprovação, seja ela, cultural ou cientifica de que a cor da pele ou o grau de exclusão de uma determinada pessoa assegure sua consciência crítica sobre a realidade em que vive. Muito pelo contrário, o que ocorre na maioria das vezes é a assunção por parte do oprimido dos valores do opressor.

Portanto, do mesmo modo que “alma não tem cor”, consciência também não e a nossa luta deve ser pautada exatamente pelo processo de conscientização da população discriminada para enfrentar e combater o racismo, como também para enfrentar e combater a injustiça, a violência e a exploração de um ser humano sobre outro. Não podemos desculpar ou passar pano em crimes bárbaros como esses, por conta da origem racial ou social de quem o cometeu. E pra isso temos que ter coragem de assumir que negros/as não são seres perfeitos. e como tal são passíveis de cometerem toda sorte de erros, nesse caso um grave. Enfim, consciência negra é o caminho.

Toca a zabumba que a terra é nossa!

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