Universidade terá curso contra preconceito religioso coordenado por babalaô

RIO — Em tempos de intolerância, a existência de um curso composto por professores de diferentes religiões, coordenado por um babalaô e sediado numa universidade católica parece estar mais próxima do sonho que da realidade. No último dia 7, no entanto, a pós-graduação lato sensu Pluralidades e Intolerância Religiosa foi aprovada por unanimidade no conselho da Universidade Católica de Petrópolis.

Com um corpo docente que inclui católicos, umbandistas, judeus, muçulmanos, protestantes e uma ex-testemunha de Jeová, o curso começará em agosto, com uma turma na universidade em Petrópolis e outra no centro de estudos Dom Vital, no Rio. Para se candidatar, é preciso ter diploma de graduação reconhecido pelo Ministério da Educação (MEC).

— Fiz questão de ter uma equipe plural. Uma coisa é falar sobre intolerância, outra é saber lidar com ela. Não é um curso de teologia, embora abordemos diversas religiões. É uma mensagem contra intolerância. Há aqueles que não querem o diálogo, mas há um setor amplo que quer — analisa o babalaô Ivanir dos Santos, que coordenará o programa.

Embora qualquer pessoa com curso superior possa se candidatar, o programa pretende atingir, prioritariamente, professores das redes particular e pública de ensino, jornalistas e líderes religiosos. A ideia é também alcançar magistrados e outros agentes que possam trabalhar o tema de forma responsável, com habilidade para mediar conflitos e criar programas sobre o assunto.

— Queremos formar pessoas capazes de desenvolver políticas públicas relativas à intolerância — afirma Carlos Frederico da Silveira, presidente do Centro Dom Vital e diretor do Centro de Teologia da Universidade Católica de Petrópolis. — Precisamos potencializar nossa capacidade de entender o outro e promover a liberdade de culto e a não agressão. Juízes, advogados e professores estão frequentemente envolvidos em problemas relacionados à intolerância. As manifestações da umbanda e do candomblé muitas vezes são violentadas. As pessoas precisam entender e respeitar os diversos credos.

UTILIDADE NAS SALAS DE AULA

Professora da educação básica, Lucimar Santos, que também faz parte do corpo docente do novo curso, conta que frequentemente os professores são confrontados com questões delicadas em sala de aula, evidenciando a necessidade de uma formação específica.

— Trabalho em algumas prefeituras com crianças do 6º ao 9º ano, e a intolerância é uma questão enfrentada diariamente. Muitos docentes deixam de dar a aula completa de cultura brasileira pela resistência de alunos e pais a aspectos culturais africanos, por remetê-los a outra religião — diz Lucimar, que é ex-testemunha de Jeová. — A banca do novo curso é bastante plural e jovem. Há pessoas ligadas ao feminismo, ao antirracismo. Na verdade, considero este um programa sobre intolerâncias diversas, ele não está voltado apenas para o público religioso.

Os alunos passarão por três módulos. O primeiro será dedicado a fundamentação e contextualização; o segundo, a intolerância, história e cultura; e o terceiro terá discussões sobre religião e sociedade. Entre as disciplinas estão Cultura Europeia, Cultura Africana, Sociologia e Antropologia da Religião.

Embora tenha nascido com o objetivo de promover a pluralidade e o respeito às diferentes religiões, o próprio curso foi alvo de preconceito em sua gênese. Ivanir dos Santos conta que foi procurado inicialmente por membros de uma universidade protestante para que construísse o curso. No entanto, o projeto precisou ser submetido a um líder religioso e, desde então, há mais de um ano, está engavetado na instituição. Diante disso, o babalaô optou por sugerir o projeto para uma universidade católica.

— Felizmente, vamos conseguir realizá-lo em outra instituição. O curso é um marco, sobretudo por acontecer neste momento de tanta intolerância e desrespeito, e ser sediado numa universidade com aspectos confessionais — acredita.

O diretor do Centro de Teologia da Universidade Católica de Petrópolis conta que, embora a proposta tenha gerado surpresa, ela foi muito bem aceita pela instituição desde o início:

— Já estávamos fazendo um diálogo inter-religioso há algum tempo. É cada vez mais importante que as religiões se unam para testemunhar que a fé também ajuda a promover a convivência social e a paz. As pessoas veem a religião como algo agressivo, mas é o contrário.

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