Vamos exaltar um pouco a beleza do homem negro?

Sabemos que esta é uma edição do mês das mulheres, mas eu queria dedicar esta coluna para deleite de duas pérolas da Netflix e exaltação destes dois personagens incríveis, interpretados por dois atores belíssimos. Veja bem: não se trata de (hiper)sexualização do homem negro, assunto muito mais delicado e complexo do que
esta coluna pode aprofundar, mas apenas a apreciação singela de dois atores que merecem todos os elogios que andam circundando a tweetsfera.


Diante de tantas discussões sérias pelas quais o país (e o mundo) tem passado no último ano em suas desgraças, como liberação de armas, políticas genocidas, falta de leitos de UTI, prorrogação da quarentena, enfim, tudo isto que está colocado, é bom ter um descanso e flertar com esses programas e suas “alienações”. Em tempos em que até o BBB virou gatilho para temas tão profundos como saúde mental, a série
Bridgerton apareceu como um refresco do mundo lá fora, bem do jeito de Shonda Rhimes, de construir mundo utópico, em que negros são protagonistas sem precisar de estereótipos ou levantar bandeiras.


Pessoalmente, sempre adorei essa linha pós-racial da Shonda: um universo em que o racismo parece já superado e que estamos livres para contar histórias, porque somos muito além da cor da pele. Mas isso é assunto para outro momento, afinal, estamos aqui hoje para exaltar a beleza de Regé-Jean Page, o duque (Simon Basset) na série. O ator britânico conquistou a simpatia do público por seu personagem que dificilmente vemos ser representado por um ator negro, forte, porém sensível. Um “Mr. Darcy” (personagem de Jane Austen de “Orgulho e Preconceito”): “negro era tudo o que eu precisava na vida e não sabia”. A personalidade é bem desenvolvida, tendo um passado e perspectivas de futuro, sem cair em apenas um “corpo negro” que fortalece a protagonista. Simon está ali para complementá-la. A sinergia dos atores também é ótima, o que deixa esse tom açucarado em uma história que sabe muito bem aonde
quer chegar. Para quem gosta de produções de época, uma verdadeira preciosidade.


No caso de Lupin, a questão é muito mais interessante, pois o personagem realmente não tem o apelo sexual de Bridgerton: Oma Sy, ator que interpreta o protagonista Assane Diop, não aparece sem camisa uma única vez, para a tristeza de fãs mais sedentas. Mas só pelo fato de ser interpretado por Omar Sy já faz com que seu personagem seja um objeto de desejo, pessoalmente falando. Por ser fã incorrigível de Omar Sy, é difícil escrever um texto sóbrio sobre a qualidade (e necessidade) real que havia desta releitura do clássico arquétipo do ladrão de casaca, principalmente com um recorte de raça, classe e territorialidade como Assane apresenta. Neste sentido, Lupin vai muito além da representatividade, é quase sublime ver um homem negro neste papel, de inteligência ímpar. Não é só uma série bem produzida, bem dirigida e bem protagonizada: é um lembrete de que os nossos talentos são infinitos quando as oportunidades chegam até nós.

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Fernanda Alcântara é jornalista, pesquisadora de quadrinhos e mestre em Comunicação na USP. Por quatro anos foi editora-chefe da Revista Raça e desde 2014 realiza palestras sobre temas como comunicação, diversidade e igualdade racial e de gênero. Fala sobre cultura pop, entretenimento e outras "nerdices".

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