Vozes femininas do Mercado de Luxo

Ana Paula Fernandes, nossa editora de moda, apresenta: Karine Amancio – Relações Públicas e Luiza Brasil, Jornalista e Comunicadora

Mais do que compreender esse mercado, queremos trazer para o leitor a visão dessas duas mulheres pretas, que estrategicamente vem ocupando espaços como o mercado de luxo, um mercado que antes era majoritariamente consumido por pessoas brancas.

Karine Amancio, 33 anos, é jornalista e comunicadora social formada pela Universidade de Ribeirão Preto. Paulistana, atua há 9 anos no mercado e já foi repórter, apresentadora e âncora de telejornal no interior de São Paulo. De volta à capital, trabalhou por 4 anos como assessora da Alexandra Loras, ex-consulesa da França no Brasil, onde colaborou com o desenvolvimento de diversos projetos com temática racial. Entre os mais relevantes, um editorial para a Vogue Brasil em agosto de 2016, onde apresentaram a ideia de um “Mundo ao Revés”. Também neste ano, criaram o TEDx “Mulheres que Inspiram” com 99% de palestrantes negras. No ano seguinte colaborou na idealização do “I Fórum de Protagonismo Feminino”. Atualmente é relações públicas na JHSF, uma holding com diversas empresas do segmento de luxo. Sua atuação está diretamente ligada à moda, onde integra o time de relações públicas à frente dos shoppings Cidade Jardim, CJ Shops Jardins e Catarina Fashion Outlet. Além das marcas retail da companhia como Balmain, Chlóe, Emilio Pucci, Isabel Marant, Celine, Inès de La Fressange, Brunello Cucinelli, René Caovilla, Aquazzura, Gianvito Rossi, Monnalisa, entre outras.

Luiza Brasil, 32 anos, é jornalista e comunicadora social formada pela PUC-Rio. Nascida em Niterói, Rio de Janeiro, é idealizadora do Mequetrefismos, plataforma de conteúdo que tem como objetivo impulsionar a partir da informação pessoas, projetos e trabalhos com foco no protagonismo negro, principalmente na indústria criativa da moda, música e artes. Colunista da Glamour, em sua Caixa Preta debate sobre questões de raça e gênero.A comunicadora começou o trabalho com moda em 2008 no RioETC, site de estilo de rua do Rio e em 2012 virou braço direito de Costanza Pascolato, em São Paulo, atuando em seu digital.Entre as premiações recebidas por Luiza Brasil está o “Influenciadores Sociais Contra o Racismo” (Influencers Againist Racism) pela Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro e o Prêmio Geração Glamour -Woman of the Year, realizado pela Glamour e o MTV Generation Change. Luiza também já atuou enquanto palestrante no TEDx em uma importante fala sobre Pertencimento e Negritude.  

Luiza Brasil Pergunta – Com essa vivência de mercado de luxo, pessoal e também profissional, quais são os desafios da comunidade negra brasileira em ascensão nesse momento?

Karina Amancio: Graças aos movimentos que a comunidade negra vem fazendo e se reestruturando dentro da sociedade, muita coisa vem evoluindo nos últimos anos. Mas obviamente muito ainda precisa ser feito. Na minha opinião é preciso descolonizar a ideia de que algo não é para nós ou de que não podemos ocupar espaço x ou y. Sabemos que o preconceito existe e fere física e mentalmente, mas é algo que precisa ser mudado. Vamos nos deparar com uma comunidadebranca onde a maioria não está acostumada a ver negros em posição de poder e destaque. E cabe a nós estrategicamente mudar essa visão e ocupar esses espaços para que se normalize a figura do negro em qualquer ambiente. Precisamos também, sempre que tivermos chance, ser agentes transformadores dentro dos ambientes que estamos inseridos, seja ela social ou profissional.

Existe uma pesquisa do Instituto Locomotiva que afirma que a população negra responde por 40% do total de consumo do país anualmente, isto é, cerca R$ 1,9 trilhões. Então temos poder de consumo, mas falta nos enxergarmos nesses ambientes. E Renato Meirelles presidente do instituto Locomotiva afirma que “Se os negros passarem a ganhar a mesma quantia que os brancos teríamos 808 bilhões de reais a mais na economia brasileira. Se não for por uma questão de justiça social que seja por Inteligência. A desigualdade racial atrapalha a economia nacional”. Essa fala dele é marcante, acho importante essa consciência. É primordial que se normalize a presença de corpos negros em ambientes de luxo. Tanto representados em publicidade como na oferta de produtos atendendo as especificidades da população negra. Precisamos nos enxergar e ser representados para consumir. Acredito que isso vem mudando bastante, mas ainda há muito a ser feito no Brasil. Mas existem marcas e empresas trabalhando ativamente para esta mudança.

Luiza Pergunta: O que você acredita em termos de Brasil serem os próximos passos desse mercado para que nos faça pertencer mais? Você enxerga uma expansão de vagas no mercado de luxo e também novas perspectivas com designers pretos?

Karine: O pertencimento real será alcançado quando forem oferecidas oportunidades iguais. Felizmente vejo uma boa movimentação de mercado nesse sentido. Acredito em grandes mudanças a médio e a longo prazo, pois muitas empresas conseguem enxergar hoje o talento e rentabilidade que os designers pretos oferecem ao mercado. Com o crescente investimento em economia criativa muita coisa irá mudar. Além do alto poder de consumo da população negra. O que falta novamente é oportunidade de mostrarem seus talentos e a sua intelectualidade. Em relação a contratação no mercado de trabalho, fico muito feliz em ver grandes empresas entendendo que não podem esperar da população negra currículos como habilidades como falar diversas línguas e ter estudado fora do país.   

Por conta do racismo estrutural, essas são oportunidades nunca foram dadas para a maioria desse povo. Isso abre possibilidades para pessoas geniais que nunca teriam chance de trabalhar suas habilidades e mostrar seus talentos. É preciso estar aberto a realmente querer fazer a diferença e reparar erros históricos para que não sigamos sem mudar o rumo da história. Empresas que contam com consultoria em diversidade estão à frente quando se trata de reparar essas questões no âmbito corporativo. O mundo em que vivemos hoje não é o mesmo de 5 anos atrás e não será o mesmo daqui 5 anos. Isso me deixa com esperança essa mudança que vem acontecendo.

Karine Pergunta: Como uma das maiores influenciadoras negras do Brasil, que conselho você daria a pessoas que querem seguir este caminho e se inspiram em você?

Luiza responde: Para mim o grande trunfo é mais do que reproduzir os formatos que já existem de luxo e de moda e termos o nosso formato e não ser meros reprodutores. Até mesmo na forma como a gente pensa e debate o luxo. A minha grande chave para estar nesse mercado tão confortável e tão confortável e tão bem e isso não me intimidar é porque estou nele a partir de uma visão construída de mim mesma e até mesmo do que eu entendo como luxo. E não através do luxo tradicional da maneira mais óbvia de se enxergar. Para nós, pessoas pretas que lutamos pelas nossas conquistas e bem materiais, luxo para mim é poder escolher em que bairro quero morar, em que tipo de casa, ter esse tipo de conforto. Precisamos sair dessas amarras, desses códigos tradicionais. Eu não quero caber no que o luxo diz que é luxo para mim. Precisamos nos sentir confortáveis com nós mesmos para também não cairmos desses gatilhos de querer tudo e achar que luxo é sobre ter a marca X ou Y e gastar tubos de dinheiro com roupa e viver endividamentos materiais. Isso não é luxo. Ter o lugar de consciência e esse lugar autoral e primitivo de quem você é. Creio que esses sejam pilares importantes para que no meu caso eu consiga subverter e consiga estar nesse patamar de conversa com as marcas que vem de fora. Foi muito importante, por exemplo, ter o reconhecimento da Dior Global e receber um convite escrito a mão em minha casa. Isso para mim é luxo, ser reconhecida desse lugar, porque a marca está observando os meus movimentos e reconhece o que faço. É sobre as minhas ideias, sobre o que construí com a minha imagem, tudo feito com muito amor, verdade e essência.

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