Yalorixá Jaciara Ribeiro reflete sobre desafios do combate ao racismo e à intolerância religiosa no Brasil

No dia de ontem, 21 de janeiro, completaram-se 25 anos desde o falecimento de Mãe Gilda de Ogum, um nome que se tornou símbolo da resistência contra a intolerância religiosa no Brasil. Fundadora do Axé Abassá de Ogum, em Salvador (BA), Mãe Gilda viu seu terreiro ser invadido e destruído. Os ataques, tanto físicos quanto emocionais, foram marcados por racismo e intolerância religiosa, levando à sua morte em 2000. Sua luta foi reconhecida em 2007, quando o dia 21 de janeiro foi oficializado como o Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa, uma homenagem ao seu legado.

Desde então, sua filha biológica e sucessora no terreiro, a Yalorixá Jaciara Ribeiro, tem liderado a luta para manter viva a memória de sua mãe e o combate ao preconceito. Para Jaciara, o maior avanço foi transformar a história de Mãe Gilda em um símbolo de denúncia e resistência “O caso de Mãe Gilda é um estímulo para que outros casos de racismo e intolerância venham à tona. Essa visibilidade é o que mais avançamos nesses 25 anos”, reflete.

Mas Jaciara também aponta os retrocessos, especialmente a falta de políticas públicas e de orientação clara para quem sofre esse tipo de violação “Muitos terreiros, principalmente os mais afastados, não sabem como denunciar. Não têm acesso à internet ou informações sobre onde buscar ajuda. É preciso maior colaboração da mídia e das autoridades.”

Mesmo com a dificuldade em denunciar, os dados de 2024 mostram um aumento preocupante. Foram registrados 3.853 casos de intolerância religiosa, quase o dobro do ano anterior. Além disso, um levantamento da JusRacial revelou que um terço dos processos por racismo no Brasil está relacionado à intolerância religiosa.

Para Jaciara, essas violências estão diretamente ligadas ao racismo “A intolerância religiosa é racismo. Atinge uma comunidade que tem nome, cor e território. Por isso, falar sobre esses dois temas é tratar da mesma luta.”

A Yalorixá também aponta o impacto do governo de Jair Bolsonaro na luta contra o racismo e a intolerância “Tivemos muitas perdas de direitos. Um presidente que incentiva a violência contra o povo negro pratica, de forma cruel, um genocídio. Isso fortaleceu comportamentos de ódio que ainda estamos enfrentando.”

Recentemente, na Bahia, a cantora Claudia Leitte foi denunciada após substituir versos sobre Yemanjá por referências cristãs em um show. Para Jaciara, o episódio reflete a falta de entendimento e respeito às religiões de matriz africana. O caso está sendo investigado pelo Ministério Público, que promoverá uma audiência pública no dia 27 para discutir ações de proteção às comunidades de terreiros.

Apesar dos desafios, a luta pela liberdade religiosa continua. No próximo sábado (25), o Axé Abassá de Ogum realiza o 2º Arrastão pela Liberdade, que levará às ruas de Salvador um cortejo com blocos afro e artistas, partindo do terreiro até a Lagoa do Abaeté.

Jaciara encerra com uma mensagem de esperança, lembrando o verdadeiro significado do Candomblé “O Candomblé é amor, é cuidado, é conexão com a natureza e com o outro. Que os orixás nos deem equilíbrio para seguir. Quando enxergamos o outro como igual, criamos uma comunidade unida, livre e cheia de amor.”

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