‘Bala não foi de raspão’, diz ator ferido em ação policial na BA; grupo de teatro divulga manifesto em Salvador

 O ator Leno Sacramento, de 42 anos, do Bando de Teatro do Olodum, escreveu em uma rede social que o tiro que o atingiu durante uma ação policial, em Salvador, não foi de raspão. O ator contestou a versão do policial na postagem e escreveu que ficou parado quando ouviu o comando dos policiais para que ele e o amigo, que estavam de bicicleta, parassem.

“Meus, meus!…Leno Sacramento presente, vivo… Eu já estou bem fisicamente, mas não psicologicamente, agradeço pela força, carinho, energia, enfim… Peço desculpas hoje por estar muito emocionado e não falar tudo que preciso falar… Mas não se preocupem, não me calarei, não nos calaremos, Ah! A bala não foi de raspão e quando eles pediram pra parar, paramos”, escreveu.

Ator do Bando de Teatro Olodum é baleado por policial civil; corregedora fala sobre o caso

A Corregedoria da Polícia Civil instaurou um inquérito para apurar a situação. Na manhã desta quinta-feira (14), a polícia detalhou que, em depoimento, o policial envolvido na ação disse que atirou para o chão e os estilhaços atingiram a perna de Leno. O policial investigado, disse, ainda em depoimento, que Leno não parou quando ele pediu que o ator parasse.

Leno participou do filme “Ó Pai ó”, que conta com atores como Lázaro Ramos e Wagner Moura no elenco. Lenon também atuou na peça “Cabaré da Raça”, que também trata sobre o racismo e tem cenas sobre a violência policial contra negro. O espetáculo também já foi protagonizada por Lázaro Ramos e é um dos mais conhecidos do Bando de Teatro Olodum. Atualmente, Leno está em cena no monólogo “Encruzilhada”, que discute o racismo e as várias mortes simbólicas que envolvem o negro.

Lázaro Ramos compartilhou manifesto do Bando de Teatro Olodum contra ação que deixou ator baleado (Foto: Reprodução/ Instagram)

Integrantes do Bando de Teatro Olodum, do qual Leno também participa, escreveram um manifesto que foi lido na manhã desta quinta-feira, no Passeio Público, onde funciona o Teatro Vila Velha, em Salvador. O ator Lázaro Ramos compartilhou o manifesto na conta dele no Instagram.

Leno Sacramento, ainda com curativos na perna, e Garley Souza, que não foi ferido, compareceram ao local onde o manifesto foi lido, mas nenhum dos dois falaram sobre a situação. O advogado do Bando de Teatro Olodum, Cleifson Dias, disse que as vítimas devem falar após depoimento à polícia, que está previsto para sexta-feira. “Leno está muito abalado psicologicamente”, enfatizou o advogado.

Leno Sacramento, ainda com curativos na perna, compareceu ao local onde o manifesto foi lido, em Salvador (Foto: Maiana Belo/G1 BA)

Emocionada, a atriz Cassia Vale, que leu o manifesto enfatizou no discurso, disse: “Isso não pode ficar impune”.

Durante a 25ª edição do Prêmio Braskem de Teatro Baiano, na noite de quarta-feira (13), os atores Cyria Coentro e Hilton Cobra também fizeram uma homenagem a Leno, através de um depoimento em tom de protesto.

“Nós não poderíamos deixar de nos manifestar contra o racismo e a truculência, que cotidianamente nos fere e nos mata. Chega de matar preto, de alvejar preto e preta nesse Brasil”, disse Cobra durante a homenagem.

Confira o manifesto na íntegra:

Nestes 28 anos de trajetória, o Bando de Teatro Olodum vem tentando sempre, de forma artística, e muitas vezes ativista, travar um diálogo com a sociedade para a gente melhorar nossas feridas, o racismo, o machismo, a homofobia, a intolerância religiosa e tantas violências geradas por esses preconceitos, que ainda permanecem em nosso país.

Diante do que aconteceu com o ator Leno Sacramento e com o cenotécnico Garlei Souza precisávamos nos posicionar. Esse é um posicionamento difícil, porque o debate é urgente e parece que existe uma solução fácil. E parece que existem lados.

Na nossa percepção, os dados que vemos todos os dias e a realidade de muitos de nós em nossos bairros, nos deixam apreensivos, não somente como artistas, mas também como cidadãos. Essa carta é, sim, de pessoas que trabalham com arte, mas que também são cidadãos como todos aqui presentes.

E entendemos e percebemos na pele, no dia a dia, como a sociedade sofre toda essa violência. A relação entre a polícia e a sociedade civil está esgarçada. A Política de Segurança Pública do País falhou. O aumento constante dos assassinatos e a sensação geral de insegurança são prova disto.

Temos a Polícia que mais mata e mais morre no mundo. Qual o nome adequado para definir isso que estamos vivemos? É guerra? É assim que devemos assumir, já que superamos em número de mortes, países declaradamente em guerra.

Policiais que também muitas vezes moram em comunidades, recebem uma remuneração inadequada e que, no dia a dia do trabalho, acabam adquirindo e se habituando a práticas que aumentam o sofrimento das famílias dos policiais e das famílias das vítimas da violência, que muitas vezes também são policiais. Precisamos fazer perguntas. E a pergunta que fazemos é: como um profissional que trabalha para o bem da sociedade, chega a esse ponto de cometer tamanha barbárie? Como atirar de forma irresponsável, em um local de grande movimento de pessoas, em dois cidadãos que passavam de bicicleta. Além de Leno Sacramento e Garlei Souza, quantas outras vítimas inocentes poderiam ser atingidas por essa ação desastrosa? Como se sente alguém que está na linha de tiro?

Quantos jovens negros são vitimados diariamente desta mesma forma? Precisamos falar sobre isso. E a responsabilidade é de todos os órgãos que trabalham com Segurança Pública. Não é responsabilidade de apenas um policial, nem de uma única instância pública.

É de todo um o sistema de segurança, de todo o governo e também da sociedade civil, que deve se perguntar qual a polícia que quer. São os policiais que precisam refletir sobre suas práticas e suas condições de trabalho. São os governantes que precisam pensar de forma responsável a segurança Pública, dialogando, reconhecendo erros, e buscando exemplos ao redor do mundo, em locais que enfrentaram os mesmos problemas, mas alteraram a relação entre a sociedade e a polícia.

Através da arte, o Bando de Teatro Olodum vem abrindo uma porta para essas questões. Desde o primeiro espetáculo, “Essa é a nossa Praia”, em 1990, abordamos a questão da segurança, questionando a conduta policial frente à comunidade negra. Abrimos outra porta, em 2002, com o espetáculo “Relato de Uma Guerra que não Acabou”, quando abordamos as diferentes facetas da greve da Polícia Militar da Bahia e da política de segurança Pública do Estado. Quase 20 anos se passaram e continuamos dizendo que Essa Guerra Ainda Não Acabou. O próprio Leno Sacramento, atualmente, faz uso do seu corpo e voz, por meio da sua arte, provocando a todos para o debate as Encruzilhadas que nos encontramos.

Estamos abrindo portas, mas a arte tem limites. Essa carta é um chamado à responsabilidade de todos.

Estamos aqui, expostos diante de vocês, para dizer: Isso não pode ficar impune, e a responsabilidade é de todos. Não apenas por Leno Sacramento e Garlei Souza, mas pelos negros e negras, jovens ou não, que sofrem a violência do racismo diariamente. Dias após dia, nestes conflitos, passando por tanto medo.

Caso

Ator Leno Rodrigues foi baleado na perna, na tarde de terça-feira (13), na Av. Sete de Setembro, no Centro de Salvador. (Foto: Reprodução)

Leno estava de bicicleta com o amigo e cenógrafo Garley Souza, indo para o Teatro Vila Velha, na Av. Sete de Setembro, quando foi baleado na região do Relógio de São Pedro.

Em nota, a Polícia Civil informou que vai ser investigado se houve excesso por parte dos policiais civis durante a abordagem. A guarnição era composta por quatro policiais, mas só dois estavam diretamento envolvidos da ação que deixou o ator baleado.

Segundo a assessoria da Polícia Civil, informações iniciais são que agentes passavam pelo local e foi acionada por populares, após um assalto. O ator, o amigo e a vítima do roubo foram levados para 1ª Delegacia Territorial (DT/Barris) que vai ficar responsável pela apuração do caso, junto com a Corregedoria da Polícia Civil (Correpol)

A Corregedoria da Polícia Civil instaurou um inquérito para apurar a situação. Na manhã desta quinta-feira (14), a polícia detalhou que, em depoimento, o policial envolvido na ação disse que atirou para o chão e os estilhaços atingiram a perna de Leno. O policial investigado, disse, ainda em depoimento, que Leno não parou quando ele pediu que o ator parasse.

Leno participou do filme “Ó Pai ó”, que conta com atores como Lázaro Ramos e Wagner Moura no elenco. Lenon também atuou na peça “Cabaré da Raça”, que também trata sobre o racismo e tem cenas sobre a violência policial contra negro. O espetáculo também já foi protagonizada por Lázaro Ramos e é um dos mais conhecidos do Bando de Teatro Olodum. Atualmente, Leno está em cena no monólogo “Encruzilhada”, que discute o racismo e as várias mortes simbólicas que envolvem o negro.

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