As seis ruas mais pretas e lindas do Brasil
Lista de vias que merecem uma visita e que abrigam potências e heranças africanas
Por: GUIA NEGRO – Afroturismo, cultura negra e movimentos
O Brasil não conhece o Brasil. Complemento a frase clássica da música Querelas do Brasil para dizer que o Brasil não conhece e valoriza as histórias e cultura negra. Para contribuir nessa imersão, o Guia Negro preparou uma lista de ruas que merecem uma visita (pode ser virtualmente) e que abrigam potências e heranças africanas. Coloque na sua lista de desejos de viagem e bora potencializar nossas riquezas da diáspora negra.
1 – Ladeira do Curuzu, Curuzu, Salvador
“Quem é que sobe a Ladeira do Curuzu?”. A rua foi eternizada pelo bloco afro Ilê Aiyê que tem nela sua sede, a Senzala do Barro Preto, que abriga escola e eventos como a Noite da Beleza Negra, além dos ensaios do bloco. Por lá, também ficam os terreiros de candomblé Jitolu, que dá origem ao Ilê Aiyê, e Vodun Zo, um dos mais antigos da cidade e tombado pelo patrimônio histórico municipal. Há ainda uma série de salões de cabelereiro e barbearias especializados em estética afro, como o de Gerusa Menezzes. Um dos fundadores do Ilê Apolinário de Jesus, o Popô, tem um busto numa das esquinas. Também é possível comer a típica feijoada baiana ou fazer uma resenha tomando uma cerveja nos bares e depósitos da ladeira, que foi revitalizada recentemente e abriga bancos e placas sinalizadoras.
2 – Rua Eva Maria de Jesus, Tia Eva, Campo Grande
A via corta a comunidade quilombola Tia Eva na área urbana da capital do Mato Grosso do Sul. Por lá, fica a Igreja São Benedito, a mais antiga da cidade, construída em 1919 e que abriga uma antiga imagem de Santo Antônio, que acompanhou a escravizada liberta Eva Maria de Jesus, a Tia Eva, no seu percurso até chegar na cidade. Também são realizadas festas para São Benedito no mês de maio e há trancistas que fazem penteados afro. É possível visitar o centro comunitário, que recebe eventos, além de comércios locais ou simplesmente trocar um dedo de prosa com algum descente de Tia Eva, tomando tereré (bebida gelada com erva mate).
3 – Rua São Francisco da Prainha, Gamboa, Rio
É uma pequena rua de paralelepípedos no coração da Gamboa, sub bairro da Saúde, que foi eleito pela Revista Time Out com um dos 50 bairros mais legais do mundo, o único no Brasil. A rua começa no Largo da Prainha, onde está a estátua de Mercedes Baptista, a única de uma mulher negra no Rio, que foi precursora da dança afro, teve sua própria companhia de dança e foi a primeira mulher negra a dançar no Theatro Municipal do Rio. Ali, acontece o samba das mulheres do Moça Prosa, que têm travado uma disputa com comerciantes do local para continuar se apresentando. Há diversos bares e restaurantes onde é possível comer e beber na calçada. A rua é ladeada de sobrados antigos, grafites e barracas que vendem bebidas e comida de rua, onde há fluxo de jovens dançando música nas noites de segunda e sexta, quando acontecem os sambas na Pedra do Sal, que fica no final de sua extensão. O local considerado um quilombo urbano carrega história e energias fortes e é berço do samba carioca e também dá acesso ao Morro da Conceição, onde fica a Casa Omolokum, restaurante que faz releituras de comidas de terreiro.
4 – Rua Dom José de Barros, República, São Paulo
No centro da capital paulistana, a rua em formato de calçadão abriga camelôs durante o dia e trabalhadores da região central, em sua maioria negros, confraternizando à noite. Tem roda de samba; o marco zero do hip hop (inscrição na calçada em homenagem aos precursores do ritmo que ali se apresentavam). Dá acesso à Galeria do Reggae, reduto dos migrantes africanos que vendem cabelos, roupas, comida e produtos musicais. O Rei do Prato Feito reúne os amantes do samba rock que bailam no interior do bar e na rua. Já a Galeria Olido é palco de aulas do ritmo. O Sesc 24 de Maio pegou o espírito da rua e inaugurou com a exposição Jamaica, Jamaica. Por ali, fica ainda a Trackers que abrigou a festa Discopedia, que hoje migrou para Pinheiros. O calçadão termina de frente ao Largo Paissandu, onde fica a Igreja Rosário dos Pretos e a estátua da Mãe Preta, que por anos foi o único monumento de mulher negra na cidade e que, apesar de um retrato servil, foi ressignificada pelo movimento negro sendo o local de término do cortejo do bloco afro Ilu Oba de Min nas sextas de carnaval e da Marcha das Mulheres Negras no 25 de julho.
5 – Rua Thomé de Souza, Liberdade, São Luís
A principal rua do maior quilombo urbano das américas, o bairro da Liberdade, em São Luís, tem gente preta até onde os olhos pode alcançar. A Liberdade tem hoje, pelo menos, 25 pontos de interesse turísticos, conforme o Guia Negro apontou. São diversos terreiros e sedes de “bois”, como o da Floresta e o Boi de Leonardo, que neste mês de junho têm festas de bumba meu boi. O complexo tem atraído atenção de visitantes que querem passeios para além das praias. Pela via estreita ladeada de casas simples, há também terreiros como o Yle Ashe Ogum Logbo e o Yle Ashe Oba Yzoo.
6 – Avenida Luiz Guaranha, Quilombo Areal no Menino Deus, Porto Alegre
Fica no meio de um bairro de classe média, que no passado já foi um local de esconderijo e depois moradia para pessoas negras, onde inclusive nasceu o samba na capital gaúcha que hoje pode ser curtido no Boteko do Caninha, que fica perto da rua. Com o nome de avenida, a pequena via sem saída é uma das últimas resistências negras do bairro. É rodeada por casas simples e baixas com alguns grafites que retratam mulheres negras e abriga a Associação Comunitário Quilombo do Areal, onde por anos a escritora Maria Helena Vargas, hoje falecida, fez trabalho de leitura na comunidade. Há ainda a escola de samba e o time de futebol Areal do Futuro, que oferece oficinas de percussão e dança e organiza ensaios na rua e carnaval. A comunidade busca o reconhecimento de área quilombola e é sempre importante lembrar: tem negros no Sul!
Fonte: Folha – GUIA NEGRO