ARTvismo no coletivo Afrobapho

ASSISTENTE DE REDAÇÃO DA COLUNA: DAVID HUDS

Formado por jovens negros LGBT’s e periféricos, Afrobapho é um Coletivo que através de manifestações artísticas, constrói redes de fortalecimento aos corpos dissidentes, materializando nas suas performances, uma intersecção entre raça, gênero e sexualidades.

Utilizando a linguagem artística como ferramenta de diálogo e sensibilização, para o público que deseja conhecer mais sobre pautas sociais. Produzem pensando na possibilidade de reconstruir as narrativas dos corpos que geralmente são oprimidos e violentados pela sociedade e ainda colocados como aberração.

Segundo diversos dados e pesquisas, sabemos que o Brasil é o país que mais mata pessoas LGBTs no mundo, principalmente mulheres trans e travestis. Uma violência que é alarmante, tanto de forma física, quanto de maneira simbólica (através de xingamentos, cerceamento dos direitos etc). Além do racismo no país, que é preocupante, culminando em estratégias de genocídio da juventude negra, resultando também no feminicídio, que tem os mais altos índices dentre a população negra e, dessa forma, numa perspectiva interseccional, atentam para o fato de que corpos negros LGBTs se tornam ainda mais vulneráveis e centrais no processo de (re) existência no Brasil.

Entrevistamos alguns integrantes do Coletivo Afrobapho, buscando conhecer um pouco da trajetória e dos discursos desse grupo de jovens negros de Salvador – BA, que reivindicam por meio da estética novos modos de existência, para além do lugar de inferioridade, na pirâmide social da cidade mais negra do mundo fora do continente africano.

“o Afrobapho é uma narrativa potente que se manifesta através de corpos dissidentes, que por muitas vezes foram excluídos, violentados e silenciados. é uma pura manifestação da liberdade do ser”. ALAN COSTA

– Como surgiu a Afropabho?

– “O Coletivo Afrobapho foi criado em novembro de 2015, inicialmente como um grupo/página digital (no Facebook) de discussão sobre pautas de intersecção entre raça, gêneros, sexualidades e classe. Foi idealizado por Alan Costa – bixa preta do Recôncavo Baiano, que sentia falta de diálogos mais inclusivos sobre racismo nos movimentos LGBTs e sobre sexualidades e gênero nos movimentos negros. Durante esse percurso, enquanto um canal que apostava em visibilizar pautas e vivências de pessoas negras LGBTs, Alan conheceu Malayka SN (bicha preta, que usa a performance drag queer e monxxtra, como narrativa de subversão ao sistema padronizado) e Ah Teodoro (bixa preta, monxxtra e fashionista). Inspirando-se na cultura ballroom revisitada no documentário “Paris is Burning”, pensamos em ampliar o alcance do Afrobapho para além das telas digitais, indo diretamente para as narrativas urbanas e da cena cultural de Salvador. 

Com isso, reunimos artistas negrxs LGBT’s da cidade, a fim de expandir as ações do coletivo para um campo em que nossas identidades e experiências de opressão seriam transmitidas para a sociedade através das artes e intervenções urbanas e culturais. Assim começamos a ir para as ruas, desenvolver intervenções temáticas, que se tornaram audiovisuais, com fortes referências e potencial de comunicação com o público. Também criamos nossa própria festa, a fim de visibilizar a arte negra LGBT, que sempre esteve à margem em Salvador. 

Viralizamos na internet, ganhamos destaque nas esferas artísticas, políticas e sociais e nos tornamos uma das principais plataformas de ARTvismo no Brasil. Hoje o Coletivo Afrobapho conta com mais de 20 artistas e parceiros envolvidos nessa trajetória. Desde a criação de conteúdo e produção artística, performances visuais, cênicas, e de dança e até mesmo na área da música.”

– Quais são as inspirações visuais/estéticas que moldam o Coletivo e suas produções?

– “Nós nos inspiramos bastante no movimento Afrofuturista, como uma referência para criar novas narrativas para os corpos negros dissidentes, para além do sofrimento e opressão. Queremos mostrar as potencialidades e riquezas que podemos produzir, a fim de projetar um futuro de realeza para os nossos, assim como nossos ancestrais abusamos da estética que não dialoga com a heteronormatividade. Queremos uma sociedade em que nossos corpos não sejam mais estereotipados em nome de um padrão estabelecido.

Buscamos referências também na criatividade da cena ballroom vista em “Paris is Burning” e mais atualizada em “Pose”. Além disso, armamos nossas identidades antes negadas, venerando as estéticas de Lacraia e Vera Verão. Nós somos continuidade delas.”

– Como o uso das plataformas midiáticas ajudaram a expansão do Coletivo, e consequentemente nas suas ações políticas?

– “As plataformas midiáticas foram essenciais para o reconhecimento nacional e até internacional do nosso trabalho, principalmente porque nosso surgimento está intimamente atrelado ao uso de uma rede social. As plataformas digitais são ferramentas poderosas de comunicação e alcance global. Sabendo disso, sempre pensamos estrategicamente sobre como falar de nossas pautas, de maneira que atingiremos o máximo de pessoas, de diversos tipos de idade e situação sociocultural. Por isso escolhemos a fotografia, o audiovisual e as artes de um modo geral, para ser esse instrumento de diálogo.

Através das plataformas midiáticas alcançamos mais de 60 mil pessoas em redes sociais. Conseguimos mais de 2 milhões de visualizações em nossos trabalhos audiovisuais. A partir do Facebook, A Anistia Internacional Brasil nos conheceu e nos convidou para fazer parte de uma campanha social chamada “Jovem Negro Vivo”. Se hoje pessoas de todo o Brasil e até de outros países conhecem nosso trabalho é por conta desse engajamento digital.”

– O que seria o corpo Artivista e Afrobaphônico na concepção do Coletivo?

– “Nós criamos ações que buscam armar as nossas existências em meio a uma sociedade genocida, racista e lgbtfóbica. Vamos para as ruas disputar o espaço urbano, para que não mais precisemos ser “aceitos” apenas em pequenos guetos. Dessa forma, nós agimos em busca do reconhecimento no âmbito dos Direitos Humanos, a fim de lutar contra o racismo, machismo, classicismo, lgbtfobia e outras opressões que afetam os corpos dissidentes. Eu acredito que o nosso papel é justamente mostrar como nossos corpos dissidentes são potentes, são incríveis, em busca primeiramente do fortalecimento da autoestima de muitos LGBTs negros no Brasil.

A sociedade nos mata de duas formas: no genocídio e no suicídio. Muitos dos nossos têm cado em depressão, tentando sobreviver nesse caos. Então, primeiro queremos fortalecer esse imaginário positivo sobre nós mesmos. A partir disso, buscar discutir sobre esses problemas sociais, de uma forma que seja acessível para boa parte das pessoas: é aí que entra o papel da arte. Nós vivemos o ARTvismo como uma estratégia de mobilização e sensibilização das pessoas sobre, como nossas formas de ser em nada afetam as suas vidas normatizadas. Penso que o corpo ARTvista é todo corpo dissidente que se expressa através da arte.

Um corpo dissidente que emana discursos através das mais variadas formas de expressão artística. Seja ela dança, a poesia, a música… é um corpo que comunica, ressignifica conceitos, que quebra padrões, arma identidades. Afrobapho são corpos negros dissidentes e ARTvistas, que armam suas identidades e vivências através de uma corporeidade poética de viver e resistir.”

“Com o impacto nacional e internacional, o coletivo Afrobapho espera ecoar mais narrativas de sensibilização social, através da arte, da produção cultural e da maestria que é o ARTvismo.” Alan Costa

GRUPO AFROBAPHO É COMPOSTO POR:

YAGO CHAGAS : DANÇARINO

DEIVID OKANJO: DANÇARINO

ELEN ANJOS:  DANÇARINA

ANGEL: DANÇARINO

MALAYKA SN : MONXXTRA, DJ, DRAG PERFORMER

AH TEODORO:  MONXXTRA, FASHIONISTA, DRAG PERFORMER

TIA CAROL  DJ, DANÇARINA

NEFTARA  DJ, DANÇARINA

PIETRO AKIN  DJ

DI CERQUEIRA:  PRODUTOR, DJ E CANTOR

MAMBAS  DUO MUSICAL FORMADO POR: SUED HOZANNA E FELIPE SALUTARI

VITTOR ADÉL:  CANTOR, PERFORMER, DANÇARINO

LUCAS MONTTY:  COREÓGRAFO E DANÇARINO

FOTOGRAFIAS: RICARDO KONKÁ, JOÃO LIMA E GABRIEL OLIVEIRA.

ASSISTENTE DE REDAÇÃO DA COLUNA: DAVID HUDS

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