Cabelo Black Power
Com mais de 27 mil seguidoras, o grupo “Meninas Black Power” propaga no Facebook o orgulho de ter cabelo crespo. Além de assumirem suas madeixas crespas em seu dia a dia, incentivam todas as leitoras a se livrarem da ditadura do cabelo alisado
TEXTO: Renato Bazan | FOTOS: Acervo pessoal/Etiene Martins | Adaptação web: David Pereira
Diante de uma época dominada pelas escovas definitivas e progressivas, as Meninas Black Power fazem o caminho inverso, querem tornar crespos os cabelos agredidos pelas químicas. Criada pela estudante carioca de enfermagem e obstetrícia Élida Aquino, a fanpage refaz o itinerário iniciado ainda no Orkut. “Meninas Black Power era uma comunidade no Orkut, e reunia quem estava descobrindo o cabelo crespo, a maioria em transição para o natural”, afirma Élida. Ao se lembrar de como descobriu a beleza dos crespos, Élida diz que enxergar a beleza do cabelo crespo natural é um processo para além da questão capilar.
“Não é só estético e não só usamos os cabelos naturais por beleza. Esse processo vem junto com a reconstrução e aceitação da sua própria identidade. Ter modelos e referências na sociedade, que comunguem a mesma ideologia, facilita muito a desconstrução do modelo de beleza vigente. Posso dizer que entre as Meninas da equipe o que aconteceu foi um retorno ao que somos. A motivação começa quando você passa a se identificar com aquilo que questiona. Assim passamos por processos que nos levaram a cogitar o natural diante de tantas opções para domar e modificar o que já era nosso. Vimos, por exemplo, as norte-americanas que fizeram o movimento transition explodir, assistimos os vídeos, lemos os textos, olhamos para os cabelos e nos enxergamos naquilo. Somos tão semelhantes na aparência, e qual o motivo de não sermos livres como elas?” Devido o grande sucesso, a página Meninas Black Power não é administrada somente por Élida: “temos, de fato, um coletivo, e dividimos nossos grupos de ação em diferentes Estados. Nossa intenção é alcançar todo o Brasil, mas por enquanto temos 14 integrantes no Rio, 13 em São Paulo, 3 em Minas, uma em Porto Alegre , uma na Bahia e uma no Espírito Santo. Minas, Bahia, Espírito Santo e Porto Alegre estão escolhendo mais meninas”, explica Élida.
Significados do cabelos Black Power
O Cabelo Black Power, também considerado por alguns como afro, foi considerado um estilo político pelo movimento de contestação dos negros desencadeado a partir da década de 60. Esse momento, ao atribuir ao cabelo crespo o lugar da beleza, representava simbolicamente a retirada do negro do lugar da inferioridade racial, no qual fora colocado pelo racismo. A originalidade de assumir o cabelo crespo passava pelo pensamento da consciência negra que, segundo Nilma, era: “Tudo isso era para desvelar a introjeção de inferioridade – não só intelectual como estética – do negro, pregada pelo apartheid. A ideia central era de que o negro oprimido se libertasse dos valores racistas inculcados pela dominação branca, resgatando a riqueza da cultura africana. A consciência enfatizada por esse movimento incorporava e dava destaque à valorização do padrão estético negro, na tentativa de liquidar o mal-estar vivido pelo negro em relação à sua própria imagem. Esse movimento de estetização negra se propaga e atinge negros e negras de vários países, inclusive, do Brasil.”