Deputada estadual americana Park Cannon em entrevista à Raça
Por Lucas de Souza Martins
A Deputada Estadual americana, Park Cannon conta como sua prisão escancarou a necessidade de avanço nas políticas de representação no sul dos EUA
Ao longo da história dos Estados Unidos, a presença de afro-americanos no cenário político mostra que ainda há um longo caminho a ser percorrido no campo da representatividade. Entre os atuais governadores dos 50 estados americanos, não há nenhum negro. Dentro da Câmara dos Representantes dos EUA, há apenas 61 representantes afro-americanos entre os 435 deputados na Casa. Quando se trata do outro lado do Capitólio, os EUA tiveram apenas onze senadores negros desde a independência do país, ocorrida em 1776. O primeiro deles, Hiram Revels, representou o Mississippi e assumiu seu cargo em 1870. O mesmo estado elegeu cinco anos depois o segundo negro senador nos EUA, Blanche K. Bruce.
Ao longo do século XIX e na primeira metade do século seguinte, eleitores afro-americanos tinham limitações para se registrar para votar, principalmente nos estados do sul, tradicionalmente os de maior tensão racial no país. A situação só começou a mudar a partir de 1965 com a assinatura da Lei de Direitos ao Voto, que nasceu como impacto do movimento dos direitos civis liderado por ativistas como Martin Luther King e John Lewis. Não foi à toa que, dois anos depois, o país elegeu o seu terceiro representante negro na Casa: Edward Brooke, de Massachusetts. A eleição ao Senado da primeira mulher negra só ocorreu, porém, mais de duas décadas depois, com a eleição de uma advogada de Illinois, Carol Moseley Braun, em 1993.
O século XXI, até aqui, já ficou marcado pela ascensão política de duas pessoas negras: o ex-presidente Barack Obama e a atual vice-presidente dos Estados Unidos, Kamala Harris, os primeiros afro-americanos a assumirem tais cargos. Ambos eram senadores antes de suas experiências na Casa Branca. Na legislatura atual, o Senado americano possui apenas três representantes negros, sendo todos eles homens.
No Brasil, até 1934, mulheres, negros e analfabetos não tinham o direito de votar. Somente após sete décadas que o país chegou a empossar o seu primeiro afro-brasileiro no Senado, por exemplo. Como suplente de Darcy Ribeiro, o dramaturgo e ator Abdias Nascimento assumiu uma cadeira provisoriamente na Casa em 1991. Seis anos depois, Nascimento assumiu o cargo em definitivo com o falecimento do titular de sua chapa. A primeira mulher negra no Senado foi a assistente social Benedita Silva, eleita em 1994, e empossada no ano seguinte.
Durante o último pleito federal de 2018, apenas 77 dos 1790 políticos eleitos em todos os níveis eleitorais se autodeclararam negros, de acordo com um levantamento feito à época pelo Congresso em Foco. Um dos dados a serem comemorados foi o aumento no número de deputados federais pardos e pretos eleitos. Na comparação entre as eleições de 2014 e 2018, o número subiu de 103 para 125. No Senado, o número subiu de cinco pardos e nenhum preto para 11 pardos e três pretos. Se os afro-brasileiros obtiveram um aumento em representatividades na Câmara Federal, o número ainda segue distante dos 56% que este grupo representa na população do país e evidencia uma clara sub-representação na política.
Park Cannon:
A prisão que escancarou as limitações da maior democracia do mundo
Ao simplesmente bater na porta do governador da Geórgia, o republicano Brian Kemp, a deputada estadual Park Cannon foi abruptamente presa pela polícia da Assembleia Legislativa em março deste ano. A acusação era ter perturbado a ordem legislativa da Casa. Enquanto Cannon era levada para a prisão, o governador Kemp assinava – a portas fechadas – uma lei que endurece regras eleitorais e dificulta o acesso de minorias ao voto. As imagens da prisão da política democrata – arrastada à força pelos corredores do seu próprio ambiente de trabalho – correram o mundo e chamaram a atenção para o que talvez seja o maior problema político dos Estados Unidos: a supressão eleitoral. Solta poucas horas depois de sua prisão, a procuradoria do estado decidiu não acusá-la formalmente diante da repercussão global do caso. Aos 30 anos e com a responsabilidade de ser a deputada mais jovem do Capitólio da Geórgia, esta jovem mulher negra e assumidamente homossexual também é conhecida por ser poliglota. Além de sua língua materna, fala fluentemente espanhol e português e já deu aulas de inglês para adolescentes e adultos em Portugal. Nesta entrevista à revista Raça, ela reflete sobre o cenário político americano, sua prisão e suas memórias por ter nascido e crescido na região sul dos EUA, considerada a de maior tensão racial no país.
Assine a Raça para conferir a entrevista na íntegra: https://revistaraca.com.br/assinatura/