Empresas: Conselho de mulheres pretas valem milhões
“Quem escolhe o presidente da empresa que você trabalha? “Se ela for grande o bastante, certamente um grupo de conselheiros! E participar do conselho de empresas requer muitos conhecimentos – técnico, político, de vida, executivo, social. Mas, ainda hoje, esses lugares são ocupados por pessoas com o mesmo perfil, gênero e pantone, no caso 88% brancos. Mulheres são minoria, 19% . Mulher negra, então, nunca vi. Ou melhor, não tinha visto até agora.
O movimento para garantir diversidade em conselhos, por exemplo, chegou às empresas listadas na Bolsa de Valores. Numa recente decisão, essas organizações devem eleger pelo menos uma mulher e uma pessoa integrante de comunidades sub-representadas em seus conselhos (pessoas pretas, pardas ou indígenas, integrantes da comunidade LGBTQIA + ou pessoas com deficiência), num prazo de dois anos .
Por que uma decisão como essa é tão importante? O conselho é formado por um grupo de pessoas responsáveis por preservar os interesses de uma empresa e monitorar os executivos e as decisões que são tomadas, pensando no futuro dos negócios, dos sócios e da sociedade. Sabe aquela tia ou tio que dá conselhos, dicas e puxa sua orelha quando algo está errado? É o conselho que contrata e demite o presidente ou CEO daquele mercado onde você faz suas compras.
Segundo o IBGC, Instituto Brasileiro de Governança Corporativa, conselheiras e conselheiros devem contribuir para o melhor da sociedade e do meio ambiente, a partir dos negócios. Ou seja, a defesa dos interesses de povos indígenas frente a uma mineradora ou a garantia dos níveis de poluição de uma usina são também responsabilidade do conselho. E essas pessoas recebem por essa orientação – fiscalização. Além de também responderem, na pessoa “física”, se uma fraude acontecer, como no caso das Americanas.
E aí é que a diversidade fortalece os negócios. Imagine 9 engenheiros pensando como atender às exigências de segurança do trabalho? Certamente, vai sobrar conhecimento técnico. Mas onde há consenso sempre, a cegueira não tarda em se instalar.
Recentemente, conheci a Jandaraci Araújo, uma das primeiras conselheiras negras do país. Ela é uma dessas mulheres magnéticas. Baiana, negra, referência em conselhos. Recebe convites aos milhares. E não se questiona sua falta de experiência em metalurgia ou medicina. Porque, não bastasse um vasto currículo, o que ela faz muito bem é perguntar. Perguntas cirúrgicas. Precisas. Que faz a todos pensarem.
À Jandaraci, se somam potências como Kelly Quirino e Lisiane Lemos. Lideranças que sabem cruzar pontes. Não por serem negras. Mas porque sabem dialogar com a sociedade de uma forma que a Faria Lima e as universidades não ensinam. Trazem consigo uma experiência que diploma não compra. Entendem do preço de ações e do custo de ser brasileira. E, sim, devem ser muito bem remuneradas por isso. Receber o que as outras pessoas recebem.
A nomeação de Anielle Franco para o conselho da metalúrgica Tupy, pelo governo Federal, é outro ponto emblemático . Ela ocorre em meio a críticas, que não entrarei no mérito porque envolvem camadas bastante profundas. Vou focar na revolução que a Anielle representa.
Enquanto executivo, adoraria dividir a mesa do conselho e discutir, ouvir e aprender com a ministra. Não ficar discutindo o indicador X ou a rentabilidade do último trimestre. Mas aprender com quem morou fora e vive o Brasil, foi professora, tem mestrado, passou por grandes desafios pessoais e profissionais, e, ainda assim, segue firme e lutando por um futuro melhor. Anielle é referência para mulheres da próxima geração. Mas ela é ministra, pode ser conselheira? Essa pergunta, ouso responder: até para promover equidade racial, uma mulher precisa fazer dupla, tripla jornada. É irônico, mas real.
De verdade, não existe resposta exata para algo complexo. Mas há a certeza de que precisamos de mais diversidade de raça e gênero em conselhos. Na agenda racial, promover equidade na sociedade passa, necessariamente, por promover ações também nas empresas. E quem sabe, com mais mulheres negras ocupando lugares antes inacessíveis, teremos mais coerência corporativa e, acredito, uma sociedade melhor.
Colunista: Juliano Pereira