Entrevista com o 1º vereador negro e travesti
Confira em nossas páginas pretas a entrevista com Madalena, o 1º vereador negro e travesti de Piracicaba
TEXTO: Maurício Pestana | FOTOS: Rafael Cusato | Adaptação web: David Pereira
Luiz Antônio Leite de Moura, de 57 anos, natural de Piracicaba, líder comunitário mais conhecido como Madalena, se tornou o primeiro travesti eleito vereador na história do município. Madalena, que sempre chamou a atenção por andar pelas ruas usando roupase acessórios femininos, foi o segundo candidato mais votado do PSDB à vereança na cidade. Nesta entrevista à Raça Brasil, o vereador fala sobre família, exclusão social, superação e a discriminação que o acompanhou por toda vida e que se intensificou, chegando a ameaças de morte, quando resolveu entrar na política. “Quero daqui alguns anos disputar a prefeitura da cidade para ajudar os mais pobres”, declara. Veja trechos da entrevista com o 1º vereador negro e travesti.
A discriminação racial e a homofobia é mais intensa em cidades pequenas?
Sim, a discriminação foi algo que me acompanhou desde que eu me conheço por gente, porém sempre levantei a cabeça. Em qualquer lugar que eu ia as pessoas falavam que eu era isso ou aquilo, cochichavam e diziam para os filhos não se aproximarem de mim porque eu tinha “problema”. Sempre respeitei e mantive a cabeça erguida. Tenho vários sobrinhos e converso com eles abertamente, digo que sou tio, irmão da mãe deles, exijo respeito para também dar o mesmo em troca. Madalena é para as outras pessoas, para eles é tio. E a relação é muito boa, existe este respeito.
Você se sente mais discriminado por ser negro ou pela sua orientação sexual? Como é a sua relação com o movimento social negro?
Não sei se sou mais discriminado por ser homossexual ou negro, acredito que os dois. Com relação ao movimento negro, minha política é muito importante para eles, o meu gabinete é aberto á todos, não tem cor, é um lugar para todos entrarem, a porta fica aberta das 8 às 17h, eu atendo todo mundo. Não sou mais que ninguém, estou aprendendo com todos. E graças a Deus muitos têm me procurado, e outros ainda irão aparecer.
Você se declara muito cristão, o que acha da “cura gay” do deputado Feliciano, que também é do interior de São Paulo?
Ou ele é louco, ou doente, ou não tem o que falar, porque as pessoas gays já são assim desde crianças. Eu já conheci gente que largou da mulher por causa da sexualidade. Acredito que a pessoa já nasce gay.
E na vida pública, quando resolveu se candidatar?
Quando fui realizar a minha campanha, não tinha dinheiro, eram cinco pessoas me ajudando. Passávamos fome, recebíamos ameaças de pessoas do partido, foi uma barbaridade. O partido prometeu muitas coisas para mim, e na hora eram apenas cinco placas e dois mil santinhos,enquanto para os outros eram 100 mil santinhos, faixas e tudo mais. O partido não queria que eu ganhasse de jeito nenhum, mas eu fui com raça e até gravei uma música do Martinho da Vila, que foi um sucesso em todo lugar e nós fomos em frente. Apesar de tudo, sempre fiquei quieto, pois não sabia se iria ganhar ou não. Foi uma campanha limpa, sem dinheiro envolvido.
Como se sentiu quando foi eleito?
É importante lhe explicar todo o processo: eu pensei que não iria ganhar, fiquei em casa sem ligar tv, rádio, nada. Era o meu vizinho da frente, que estava com o rádio ligado para saber quem iria ganhar, que me falava com quantos votos eu estava, mas eu nem ligava, até que cheguei a 3 mil votos e ele soltou um rojão e disse que eu ia ganhar. Pouco depois, foi até minha casa anunciar que eu tinha ganhado, aí a minha rua lotou de pessoas para me dar os parabéns, e eu fiquei muito feliz, porque foi uma eleição muito boa, eu não paguei para ninguém. Durante a minha campanha o partido havia me prometido 10 carros, e não me deram nada, deram 15 litros de gasolina para 10 carros, não tinha como fazer nada. Eu arranjei 50 pessoas para me ajudarem, mas não tinha dinheiro para pagá-las e acabei dispensando todas.
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