Estatuto da Igualdade Racial – 10 anos depois

Em 20 de julho de 2020, a Lei 12.288/2010, completou 10 anos de criada. Refiro-me ao Estatuto da Igualdade Racial que foi sancionado pelo Presidente Lula, no último ano do seu mandato. Claro que esta Lei foi um avanço, aliás, qualquer passo, por menor que seja, na direção da promoção da igualdade racial, particularmente no Brasil, deve ser celebrado. Também é verdade que o Estatuto, apesar dos esforços empreendidos, não conseguiu ultrapassar a dimensão de uma carta de boas intenções.

Liderado desde o seu nascedouro pelo Senador Paulo Paim, o Estatuto foi uma construção coletiva ampla, participativa e que contou com o apoio dos mais variados setores da sociedade brasileira. Artistas, empresários, parlamentares, lideranças e entidades do movimento negro se mobilizaram, pois viam nessa proposta um caminho mais curto para a superação das desigualdades raciais em nosso país.

Era o mecanismo que poderia retirar a luta pela igualdade da retórica oficial da “democracia racial” e fazê-la avançar. E para tanto, havia um dispositivo considerado fundamental para o funcionamento do Estatuto – que era o Fundo Nacional de Promoção da Igualdade Racial. Assim descrito no seu Capítulo IV:

  • “ Art. 26. Fica criado o Fundo Nacional de Promoção da Igualdade Racial para a implementação de políticas públicas que tenham como objetivo promover a igualdade de oportunidades e a inclusão social dos afro-brasileiros, especialmente nas seguintes áreas:” I – promoção da igualdade de oportunidades em educação e emprego; II – financiamento de pesquisas nas áreas de educação, saúde e emprego voltadas para a melhoria da qualidade de vida da comunidade afro-brasileira; III – incentivo à criação de programas e veículos de comunicação destinados à divulgação de matérias relacionadas aos interesses da comunidade afro-brasileira IV – incentivo à criação e manutenção de microempresas administradas por afro-brasileiros; V – concessão de bolsas de estudo a afro-brasileiros para a educação fundamental, média, técnica e superior; VI – apoio a programas e projetos dos governos federal, estaduais, distrital e municipais e de entidades da sociedade civil para a promoção da igualdade de oportunidades para os afro-brasileiros; VII – apoio a iniciativas em defesa da cultura, memória e tradições africanas e afro-brasileiras.

 

Ou seja, ali estava o coração do Estatuto, o meio e a forma para a consecução dos seus objetivos, assim como os mecanismos para a obtenção dos recursos financeiros necessários para sua materialização. Mas lamentavelmente, nas negociações feitas com o então relator do Projeto, Senador Demóstenes Torres, de triste memória, esse capítulo, foi simplesmente, excluído integralmente quando da aprovação do Estatuto, fazendo com que o mesmo se transformasse numa mera declaração de princípios.

Tanto isso é verdade, que em 2015, o tema voltou ao Congresso através da CPI da Câmara dos Deputados, que apurou casos de violência contra jovens negros e aprovou, por unanimidade, um relatório que propunha a criação do Fundo Nacional de Promoção da Igualdade Racial, Superação do Racismo e Reparação de Danos. Do mesmo modo, em 2016, o Senador Paulo Paim voltou a carga e apresentou Emenda à Constituição (PEC) 33/2016, com o mesmo objetivo, reforçando mais uma vez que, sem este instrumento, seria difícil corrigir o erro histórico que se vem cometendo para com os negros no Brasil, que é a discriminação.

Nesta celebração dos 10 anos, não podemos esmorecer. A luta continua para que o Estatuto se transforme em realidade e, para tanto, o Fundo de Promoção da Igualdade Racial é essencial.

Toca a zabumba que a terra é nossa!

 

*Os artigos assinados não refletem necessariamente a opinião da RAÇA, sendo de responsabilidade exclusiva dos respectivos autores.

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Mestre em Cultura e Sociedade pela Ufba. Ex-presidente da Fundação Palmares, atualmente é presidente da Fundação Pedro Calmon - Secretaria de Cultura do Estado da Bahia.

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