Filmes sobre a história da mulher negra
A Revista Raça Brasil selecionou 4 importantes produções cinematográficas para você. São histórias para se assistir em algum momento da vida e refletir sobre como elas dialogam com a realidade e a história da mulher negra
TEXTO: André Rezende e Smilton Pinheiro | FOTOS: 40 ACRES & A MULE FILMWORKS – ©1991 e Divulgação | Adaptação web: David Pereira
Histórias Cruzadas (2011)
Baseado no livro de grande sucesso de Kathryn Stockett e ambientado na cidade de Jackson, Mississippi, Histórias Cruzadas conta a fascinante história de mulheres afro-americanas que servem famílias brancas na conflitante década de 1960. A jovem jornalista Skeeter (Emma Stone) acaba de terminar a faculdade e sonha em ser escritora. Como primeiro emprego, passa a escrever uma coluna sobre limpeza para o jornal local, e como nunca teve que fazer trabalhos domésticos sozinha, pede a ajuda de Aibileen (Viola Davis). E é através das conversas com Aibileen que Skeeter decide escrever um livro sobre a vida das empregadas domésticas em Jackson.O filme é centrado em torno do racismo e da relação entre a maioria dos personagens brancos, principalmente Hilly (Bryce Dallas Howard), Elizabeth (Ahna O’Reilly), e Jolene (Anna Camp). Nestas casas, as empregadas domésticas fazem praticamente tudo para estas mulheres, desde a limpeza até a criação dos filhos, mas são proibidas de usar o mesmo banheiro que elas. Mesmo diante de um assunto sério, o filme não se mostra grosseiro, tampouco excessivo em nenhum momento. Histórias Cruzadas é cheio de riso, em especial pela atuação do elenco, que fez um trabalho fantástico ao retratar seus personagens como seres humanos reais, em vez de caricaturas. Este é o caso da vencedora do Oscar de melhor atriz coadjuvante, Octavia Spencer, que interpreta a memorável Minny.
Diário de uma Louca (2005)
No filme Diário de uma Louca Charles McCarter (Steve Harris) e sua esposa Helen (Kimberly Elise) são um casal prestes a comemorar 18 anos de casados, num casamento que parece ideal. Mas Helen é surpreendida quando chega em casa e suas roupas estão sendo carregadas. Em meio a este escândalo, ela descobre que Charles está despejando-a e mudando-se com sua amante, Brenda (Lisa Marcos), com quem ele tem dois filhos. A partir deste momento, o filme se transforma no drama de Helen, abandonada por seu marido cruel e forçada a começar uma nova vida, que passa a ser invadida pela avó “louca” Maeda (Tyler Perry). Madea, personagem mais popular de Perry atualmente, ensina Helen a arte do retorno triunfal, como na cena em que elas rasgam a roupa da amante. “Esta é para cada mulher negra que já teve um problema com um homem negro”, grita Madea, como se a mensagem fosse para cada mulher que estivesse assistindo ao filme. A personagem Helen, a clássica dona de casa desprezada, é tratada como um mártir para que o público feminino possa se projetar nela. Com uma personagem tão descomunal como Vovó Maeda, Diário de uma Louca beira o inoportuno em seu melodrama. O filme é um grande jogo de paixão para as mulheres negras, e o diretor não pretende apenas contar uma história, mas atingir o público em seus pontos fracos.
Febre na Selva (Jungle Fever – 1991)
Como diretor, Spike Lee dispensa apresentações. Uma das maiores revelações do cinema norte-americano do final do século 20, ele sabe como ninguém mostrar uma visão geral avançada e única da tensão racial urbana. A começar pelo próprio título deste filme, Jungle Fever, termo usado por Spike Lee para a atração sexual saudável entre diferentes raças. Flipper Purify (Wesley Snipes) é um arquiteto jovem e ambicioso, de uma tradicional família do Harlem, temente a Deus. Flipper é casado com Drew (Lonette McKee), mas mantém um romance com Angie (Annabela Sciorra) uma secretária italiana. Quando sua esposa descobre a traição, o abandona. Outro problema de Flipper é o irmão Gator (uma das apresentações mais notáveis de Samuel L. Jackson), viciado em crack. Quase todos os personagens têm algo a dizer sobre a relação de Flipper e Angie. O “fervor racial” no qual se encontram e a paixão à flor da pele com a qual Spike Lee ilustra o casal fazem com que permaneçam juntos e tentem assumir o romance. Por muitas vezes, parece que Spike Lee carrega os dois personagens não como seres humanos, mas como representantes de negros e brancos, assim como todos os demais personagens os enxergam. O diretor mostra meticulosamente os motivos que impulsionam Flipper e Angie a permanecerem juntos, ao mesmo tempo em que forças cada vez mais violentas que o separam. É um filme indubitavelmente perspicaz e psicológico, com atuações marcantes.
Produção nacional sobre a história da mulher negra
Filhas do Vento (2004)
Representando a produção brasileira, Filhas do Vento fecha nossa seleção de filmes por abordar temas pertinentes às mulheres de qualquer parte do mundo. O filme conta a histórias de duas irmãs, Cida (Ruth de Souza) e Jú (Léa Garcia), que vivem em uma pequena cidade do interior de Minas Gerais e que, respectivamente, tinham sonhos diferentes: uma queria se tornar uma atriz famosa, outra com ambições muito mais simples, como continuar a viver com o pai Zé das Bicicletas (Milton Gonçalves). Depois de um mal-entendido, o pai expulsa de casa a irmã que sempre quis ser atriz. Separadas por quase 45 anos, finalmente se reencontram no funeral do pai, mas percebem que tempo não foi suficiente para curar as tristezas provocadas pelos incidentes que marcaram suas vidas. Enquanto Cida tornou-se uma mulher solitária, mas com uma carreira de atriz de cinema e telenovela, Maria D’Ajuda nunca saiu do interior, cuidando do pai até a morte. Quando se reúnem novamente, elas finalmente têm a oportunidade de se confrontar sobre suas mágoas e a difícil tarefa de perdoar uma a outra. De forma perspicaz, o diretor Joelzito Araújo coloca como pano de fundo desta história os fantasmas do racismo e da escravidão em diversos personagens. Ele se orgulha de ter o maior elenco negro em um filme brasileiro, que inclui atores conhecidos e experientes como Taís Araújo, Thalma de Freitas, Milton Gonçalves, Ruth de Sousa, Léa Garcia, Zózimo Bulbul, Jonas Bloch e Rocco Pitanga, entre outros. Filhas do Vento, depois de vencer a mostra intitulada Premier do Filme Brasileiro, promovida pelo MoMa (famoso Museu de Arte Moderna dos EUA), recebeu ótimas críticas do jornal The New York Times, que o colocou entre os melhores filmes do ano. É, sem dúvidas, um filme brilhante, com personagens ricos e bem explorados.
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