Lázaro Ramos lança livros voltado para o público infantil

O ator lança mais dois livros voltados para o público infantil, se posiciona contra tentativas de acabar com a isenção de imposto sobre livros e afirma “Não é só rico que gosta de ler”.

Lázaro Ramos é ator, diretor, cineasta e produtor, mas para um grupo especial, ele é o autor de livros que abordam com sensibilidade temas pertinentes à infância – e aqueles do mundo adulto que chegam aos pequenos.

Com mais de meio milhão de obras vendidas, Lázaro, está de volta às livrarias com O Pulo do Coelho, um trabalho inédito sobre um coelho que aprende a sonhar, e Edith e a Velha Sentada, no qual ele revisita o texto publicado em 2010, sobre uma menina que vivia no mundo do computador.

“Esses dois livros foram muito inspirados na observação das crianças que me cercam. As questões de autoestima, o tipo de brincadeira que elas fazem, o jeito de sonhar que elas têm, o tema da autonomia…”, conta Lázaro. “Dessa vez não foi só a inspiração dos meus filhos, mas de afilhados, colegas de escola”, diz ele, que tem dois filhos, João Vicente, de 9 anos, e Maria Antônia, de 6, com Taís.

Lázaro conta que os filhos são sempre os primeiros a ler seus livros (“João já corrigiu pontuação”), assim como a atriz, que dessa vez ficou de castigo por ter feito graça com o nome original do coelho, que seria Luluco – na versão final ele virou Gusmão. Bem-humorado, ele diz  que, assim como a mãe de Edith no livro, já recebeu conselhos não solicitados de outras pessoas sobre a forma de criar os filhos, e que também tem de regular o tempo de João e Maria no computador e celular. Já a convivência mais estreita em casa durante a pandemia, foi tranquila.

“Ficar com os filhos não foi tão difícil, foi difícil ficar comigo mesmo. Meus filhos e minha esposa me trazem saúde e leveza”, diz. “Mas ficar comigo mesmo é que foi o maior desafio, porque eu sempre fui uma pessoa que fugia de mim”, assume Lázaro, que faz terapia on-line e diz que o exemplo é fundamental para estimular o hábito da leituras nas crianças. Ele também se posiciona contra tentativas de acabar com a isenção de imposto sobre livros. “A gente precisa lembrar que diferentemente do que foi dito, não é só rico que gosta de ler. Quando você aumenta a taxação de um livro você está retirando esse direito de uma camada gigante da população que tem muito prazer com a leitura”, diz.

De onde veio a ideia para seus novos livros?

Edith é uma reedição, com novas ilustrações e pequenas partes reescritas. Ele estava fora de circulação e nessa oportunidade de reimprimir eu fui muito inspirado pelo ano passado. Vi que o livro era muito útil para esse período que a gente está vivendo porque fala sobre equilíbrio no uso da tecnologia. Hoje vários pais e mães estão neste momento, naquele conflito dentro de casa para tentar equilibrar o tempo que seus filhos ficam na frente do computador. Achei que era uma bandeira lúdica, bem-humorada e saudável para falar sobre esse assunto, além da questão da autoestima.

E o Pulo do Coelho?

O Pulo do Coelho eu comecei há três anos e finalizei na pandemia. Assim como o outro, com humor, ludicidade e emoção, a gente está falando um pouquinho de confinamento, que é a história de um coelho que estava preso em uma cartola e resolve fugir para se tornar mágico. Esses dois livros foram muito inspirados na observação das crianças que me cercam. As questões de autoestima, o tipo de brincadeira que elas fazem, o jeito de sonhar que elas têm, o tema da autonomia… Dessa vez não foi só a inspiração dos meus filhos, mas também afilhados, colegas de escola.

Você diz que escrever para crianças é uma das maiores responsabilidades de um autor. Com quem você bate os seus livros para saber se está no caminho certo?

Antigamente eu tinha medo da crítica e hoje em dia eu tenho meu processo. Eu aprendo muito com a crítica. Sempre. Os primeiros leitores são as crianças lá de casa, depois procuro filhos de amigos que estejam na idade para qual o livro é indicado. Aí mando o texto para crianças de colégios particulares e públicos sem elas saberem quem é o autor e sem ilustração. A partir da crítica delas ao livro eu reescrevo. Esse tem sido o processo já há alguns anos e é muito legal, porque o texto amadurece um pouco. Eu quero que as crianças se divirtam com o livro, que elas curtam, que elas entendam o assunto que eu quero falar.

Como é a reação de seus filhos?

Às vezes eu escrevo correndo e não pontuo tão bem, e João já corrigiu pontuação dizendo ‘falta uma vírgula aqui’. Os meus filhos geralmente falam ‘gostei, não gostei, não entendi’. Esse ‘não entendi’ também me ajuda a me expressar melhor com eles. Mas eu vivi uma experiência com a Velha Sentada que foi muito linda.

O que aconteceu?

O livro, a primeira vez que eu escrevi, ele era somente para fazer uma crítica a crianças que ficavam o tempo todo na frente do computador e do celular. Quando eu mandei para alunos de uma escola o texto sem ilustração, algumas crianças desenharam o trecho que Didi ficava afogada no seu computador, uma parte fez ela se afogando mesmo e outra fez ela nadando. Aí compreendi que em vez de fazer um livro que criticasse a tecnologia, teria que fazer um livro que falasse de equilíbrio. Entendi o que elas estavam me dizendo, ‘ah, tio, peraí, você vai dizer que é só para eu não ficar na frente da televisão ou do computador? É só isso, é simples assim?’.  Elas estavam questionando que o computador pode ser bom se for bem usado, depende do tempo. E aí eu transformei o livro inteiro, na verdade, através do olhar das crianças.

Taís também é uma leitora inicial dos seus livros?

Taís lê também. Ela nem é louca de não ler, ela é forçada a ler, não tem essa alternativa (risos). Na verdade O Pulo do Coelho eu fiz birra com ela, porque leu a primeira versão e, que realmente tinha um monte de defeito. Taís ficou fazendo piada porque o nome do coelho era Luluco, um nome meio ruim, e fiquei ofendidíssimo (risos). Falei ‘você só vai ler quando  tiver pronto agora’. Aí ela me via lendo e falava ‘ah, deixa eu ler, mozinho’ e eu ‘não, vai ler e pronto’. E Taís só leu o livro pronto.

A Edith vive no computador, o que é um problema de muitos pais. Passa por isso com seus filhos?

É uma realidade na minha casa, sim, tanto do João quanto da Maria. Mas varia muito, depende da semana, tem semanas que a gente consegue estar mais presente e limitar esse tempo. Aula on-line também é um desafio porque acaba que fazer a aula na frente da tela e ainda se divertir na frente da tela é um excesso. Então todo dia tem essa conversa. Mas, no geral, usamos (a opção) de controle parental de assuntos (em computadores) e de tempo no tablet deles.

A vizinha intrometida de Elenita, mãe de Edith, é meio que a realidade de todos os pais – alguém querendo ensinar como você tem que criar seu filho. Também é algo que você vivenciou?

O tempo todo! Eu lembro da Taís ainda grávida do João e eu fui no supermercado comprar uns legumes. Um senhora pegou no meu braço e falou ‘você não vai pegar esses porque sua esposa está grávida’. Ela foi comigo e escolheu os legumes todos, legumes que eu não queria, botou no carrinho e eu paguei e levei (risos) Mas achei legal porque o conselho dela foi bom. Mas sempre tem gente dando conselhos. Eu acho natural. Não tem como você ser uma pessoa pública e não lidar com a expectativa dos outros.

Não te incomoda?

Na maioria das vezes isso vem de um lugar de carinho. Eu não posso reclamar, as pessoas são muito carinhosas com a nossa família. Sempre desejam coisas boas, dão conselhos, às vezes são coisas que a gente discorda, mas também não vale entrar em conflito nisso. Quando vem alguém de fora a gente escuta, se fizer sentido, a gente absorve, se não fizer a gente dá um sorriso, faz uma cara de paisagem, faz ouvido de mercador e agradece.

O Pulo do Coelho ensina que podemos ser quem quisermos e estar em todos os lugares, e esse é um ponto que você sempre estressa nos seus trabalhos: que o negro pode e deve estar em todos os lugares. É um paralelo como o fato de que nenhum sonho deveria ser vedado às crianças?

Também é sobre esse tema, mas é um pouco anterior a isso: às vezes conversando com criança eu pergunto ‘você tá sonhando com o quê?’. Tem crianças que eu noto que nem sabem que têm o direito de ter um desejo ou um sonho, ou seja, criar uma meta de vida para elas. Isso é independentemente da classe e da raça, mas claro que uma criança negra recebe um estímulo diferente, não há como negar isso.

E você também fala de outros percalços que as crianças encontram no dia a dia…

Como eu também não gosto de fazer as coisas tudo ipsis litteris e facilitar, tem também outro detalhe que é aquela frase que está numa página inteira e não é à toa: ‘Não há sucesso e nem fracasso que seja eterno’. É também para falar de frustração, que para além do criar desejos, do sonhar, eu percebo também que as nossas crianças têm muita dificuldade com o não, com o serem contrariadas ou lidarem com a negativa e com o fracasso, tanto o fracasso pequeno quanto grande. É um assunto que eu acho que a gente tem que conversar. Então o livro é cheio de estímulos: se por um lado ele fala sobre os sonhos, por outro lado fala também da vida real, do caminho a gente vai enfrentar uns desafios, não se deslumbre com o sucesso e nem se desestimule com o fracasso.

Edith tem temas bem atuais  como bullying, fake news, autoaceitação, imigração,  maternidade solo, o ritmo acelerado em que vivemos… Como você selecionou o que entraria no livro?

Tenho noção de como autor eu tenho um espaço que eu vou ocupar e que isso vai ser complementado pela conversa com as famílias e professores. Todos os livros têm sempre um guia do professor para aprofundar esses assuntos, feito pela editora. Eu me limito ao meu lugar de autor e de estimular a conversa. Eu gosto muito do retorno que os pais me dão.

Você consegue tirar algum tempo para escrever, todos os dias?

Não tenho a menor rotina, é uma bagunça horrorosa, as anotações são todas bagunçadas, tem mensagem que vai para o WhatsApp de Taís, tem outras que eu escrevo no laptop, umas em pedaços de papel, em bloco de notas do celular e vira uma bagunça quando eu vou organizar o livro. Eu escrevo o tempo todo, mas às vezes o que eu chamo de escrever não é exatamente sentar no computador e digitar. Às vezes a minha escrita é mental, capítulos inteiros. Vou cozinhando aqui dentro na cabeça e no coração e quando sento para escrever eu vomito.

O mercado editorial no Brasil vem passando por dificuldades, desde a crise financeira à vontade do governo de na proposta de Reforma Tributária acabar com o fim da isenção de impostos aos livros. Como você vê seu papel nesse setor?

Primeiro a gente precisa lembrar que, diferentemente do que foi dito, não é só rico que gosta de ler. Acho importantíssimo dizer isso. Quando você aumenta a taxação de um livro, você está retirando esse direito de uma camada gigante da população que tem muito prazer com a leitura. E como autor eu percebo isso, o fato de ser uma figura pública e de ser ator também e ser conhecido me dá oportunidade de todos os dias eu receber alguma mensagem de alguém que leu um livro e quer indicar para mim.

Ainda hoje o preço inviabiliza a leitura para muita gente…

A gente precisa permitir que o livro possa chegar na mão das pessoas e o preço é fundamental nisso. Eu conheci uma moça outro dia que ela me falou que ela só teve um livro na vida e que ela relia esse mesmo livro porque ela não podia comprar outro. Como autor, eu procuro fazer a minha parte: além de visitas a escolas, particulares e privadas, presenciais e on-line para conversar sobre o prazer da leitura, sempre procuro nas primeiras semanas de lançamento de um livro, conseguir fazer promoções, do livro autografado, do livro mais barato. Esse ano inclusive eu fui a campo para negociar com sites de venda para dizer ‘pô, vamos baixar aquela taxa para o preço baixar um pouquinho, nas primeiras semanas poder ter uma promoção’, Estou tentando fazer a minha parte aqui, mas isso também não é possível sempre porque é toda uma cadeia produtiva, tem a editora, a gráfica, o site que vende, e aí às vezes fica difícil conseguir.

Como é o hábito da leitura em sua casa? Você lê com seus filhos?

Para tudo na vida com relação à criança, os nossos filhos estão nos olhando o tempo todo. Não adianta dizer para a criança ler se você não lê na frente dela, se não conversa sobre os livros que você leu na frente dela, e se, principalmente, se você não sai do lugar, do pedestal de autoridade para falar sobre livro, que eu acho que é prejudicial para o estímulo à leitura.

O que seus filhos leem?

Eles têm uma leitura muito eclética. Naturalmente tem alguns livros que eles se apaixonam, por exemplo, Maria está apaixonada pelo Amoras do Emicida e pela série Diário de Pilar. João acabou de entrar no Harry Potter. Ele é um leitor voraz e agora está lendo sobre os assuntos que interessam a ele: planetas, matemática, ciências… É o mundinho dele aí e ele adora. Mas eles têm leitura muito eclética, leem de tudo.

Como o livro tem que ser abordado com as crianças?

O livro para mim tem que ser falado como prazer, e não como obrigação porque realmente o livro quando eu leio me faz companhia, me diverte, me leva para novos mundos, me informa. É pouco assim que a gente trata o livro na casa da gente, desde cedo, desde pequeno com o livrinho de banheira. É fazer parte da rotina, porque livro é uma coisa tão legal, não queria nem falar como pai nem como autor, queria falar como leitor. Nessa pandemia é difícil ler, inclusive, conseguir concentrar… Mas muitas vezes quando estou precisando de uma coisa para desafogar, para ir a outro mundo ou para pensar em novas coisas e refrescar o pensamento, eu encontro isso na leitura. Não é em outro lugar, é no livro. E aí eu escolho o livro que faz mais sentido no dia e ele vai me dando isso, vai me trazendo saúde.

Impossível não perguntar: como foi sua rotina em casa nesses últimos tempos?

Trabalhar de casa: teve mudanças. No começo era tenso porque eu me obrigava a escrever, e nada tinha qualidade. Era tudo produzido a partir da tensão, os textos não era bons. O livro adolescente que estou escrevendo eu achei que estava bom e quando fui reler era soturno, triste, tenso, contaminado pelo meu dia a dia. Depois quando eu entendi que eu tinha que resgatar o lugar que a escrita sempre teve para mim, que é um lugar de companhia, aí tudo fluiu, porque eu comecei a não me obrigar a escrever em horário nenhum. Escrevi muito de madrugada na insônia, transformei a insônia num momento produtivo. Comecei a gravar também, quando eu tinha uma ideia, gravava e depois eu transcrevia.

Ou seja, você não consegue escreve ‘obrigado’.

Eu acho que só sou autor por isso, eu não sei se eu saberia ser autor por encomenda, de ter obrigação de ter um livro a cada semestre e com determinado assunto. Eu escrevo porque tem alguns assuntos que eu quero comunicar para as pessoas e que talvez eu tenha algo a contribuir nesse tema e ele vem naturalmente. Quando ele vai para o lugar da obrigação fica soturno ou sem qualidade.

Foi tranquila a pandemia com João e Maria?

Ficar com os filhos não foi tão difícil, foi difícil ficar comigo mesmo. Meus filhos e minha esposa me trazem saúde e leveza. Claro que a gente teve os desafios de administrar organização de casa, aula on-line, fazer eles conseguirem ficar na frente do computador estudando, que é difícil, muito difícil. Mas ficar comigo mesmo é que foi o maior desafio, porque eu sempre fui uma pessoa que fugia de mim. O tempo todo você vai me ver acompanhado por alguém, inventando  um almoço, uma visita para papear. Eu sempre fugi muito de ficar comigo. E acho que o maior desafio da pandemia foi ficar comigo, com os meus anjos e os meus demônios.

Então não teve tensão em casa.

Os meus filhos e a minha mulher me trouxeram desafios que são totalmente administráveis porque eles são ótimas companhias. Claro que tem todas as tensões de pai  ‘pôxa, tá tempo demais na frente da televisão, pôxa não tá conseguindo fazer aula on-line, ai meu Deus do céu, que bagunça está essa casa, arruma seus brinquedos’. Teve isso tudo também, mas, entender por que é que eu não estava conseguindo me comunicar com eles em relação à bagunça é que foi um grande desafio, porque passa por nós também. Para a gente criar filhos de uma maneira mais leve passa por nós nos olharmos também esse que é o desafio.

Você faz terapia?

Estou aprendendo a conviver com mim mesmo. Já fazia terapia, continuo fazendo, demorei para me adaptar para terapia on-line, mas só a consciência disso já é muito legal. Tenho me freado muito tentando entender o que no outro está me afetando e o que tem de mim nessa reação para ser tão incomodado com algumas coisas. Não é fácil não, é um exercício diário. É o exercício da convivência que é o que a gente precisa na verdade. Eu tenho pensado muito em quando a gente puder circular e ir na casa das pessoas o que vai ter aprendido e absorvido nesse período.

Quais os seus outros projetos editoriais?

Estou escrevendo o Você não é Invisível, que é para os adolescentes e um adulto que ainda está sem nome. O adolescente é uma ficção sobre dois irmãos, cheio de assuntos múltiplos, e o outro é filho do Na Minha Pele, se pretende ser um livro que ajude a gente a pensar o nosso tempo e agora muito no viés ligado à educação e à cultura. Estou escrevendo meio no vômito (risos). Não estou me limitando muito, escrevo qualquer coisa e vejo o que vai dar.

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