Me poupe, senhor Defensor Público!

Vergonhosa, não há outra expressão para classificar a Ação Civil Pública encaminhada à Justiça por um Defensor Público Federal, esta semana, contra o Magazine Luiza, exigindo 10 milhões de reais de indenização, por conta da empresa estar implementando Ações Afirmativas na seleção dos seus funcionários.

Semana passada, havia publicado aqui na Revista Raça, um artigo comentando o assunto, intitulado “Racismo, Cinismo e Hipocrisia”, no qual tratava dessa patologia social que se faz presente em nossa sociedade, que há séculos, apesar de todas as evidências, cientificas, políticas e históricas, finge que não houve escravidão, que não há racismo e nem muito menos discriminação no Brasil.

Mas, confesso, não imaginava que fosse partir de um membro da Defensoria Pública da União, instituição que tem como missão constitucional “… a orientação e consultoria jurídica, a promoção dos direitos e a defesa judicial e extrajudicial, em todos os graus, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados.”, que viesse o exemplo mais escatológico do racismo contemporâneo em nosso país.

Quando li a notícia pela primeira vez, achei que era fake news. Até porque os absurdos são em cascatas e vão desde a admissão do “racismo reverso”, algo provado e comprovado como inexistente, por qualquer rábula de botequim, até a mistura proposital dos conceitos das Ações Afirmativas, já chancelas pelas mais altas cortes jurídicas no Brasil e no exterior, com processos discriminatórios. Culminando com o pedido estúpido de uma multa de 10 milhões de reais ao Magazine Luiza para ressarcimento por danos morais coletivos.

Não bastasse todos esses absurdos, o tal “Defensor Público”, chama as Ações Afirmativas de marketing de lacração, desqualificando com linguagem chula, uma política pública que tem servido tanto no Brasil quanto no mundo, para reparar minimamente as consequências perversas da escravidão, do racismo e da discriminação.

Não acredito que isto seja apenas um erro, fruto da ignorância de um incompetente de plantão. Como também não acredito que esta ação seja fruto do acaso. Para mim, isto é fruto sim, de uma ação orquestrada e meticulosamente planejada, por setores racistas e reacionários da sociedade brasileira para intimidar e impedir, a qualquer custo, que o Brasil avance minimamente na conquista dos direitos sociais.

Por isto mesmo, merece a reação firme, não apenas das vitimas desse processo histórico de exclusão, que são os descendentes de africanos, mas de todos aqueles que comungam e defendem a igualdade, a justiça e a fraternidade, não como algo simbólico, mas como um elemento necessário para o desenvolvimento do nosso país.

 

*Os artigos assinados não refletem necessariamente a opinião da RAÇA Brasil, sendo de responsabilidade exclusiva dos respectivos autores.

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Mestre em Cultura e Sociedade pela Ufba. Ex-presidente da Fundação Palmares, atualmente é presidente da Fundação Pedro Calmon - Secretaria de Cultura do Estado da Bahia.

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