MNU – Do tempo em que falar de racismo era proibido

“Ainda somos os mesmos e vivemos como nossos pais.” (Belchior)

Quem vê as discussões acaloradas, posicionamentos inflamados e as diversas manifestações antirracistas dos dias atuais principalmente em redes sociais, não se lembra de que até muito pouco tempo esses eram assuntos meio tabus em nosso país. Matérias que não se discutia nem bancos escolares muito menos em outros lugares públicos, quando se falava, logo vinha aquela frase corriqueira: “Racismo não é coisa do Brasil e sim dos
Estados Unidos, onde negros não têm os mesmos direitos que os brancos”.

Qualquer pessoa com mais de quarenta anos deve ter ouvido a frase a cima, e isso foi dito tantas vezes que muitos de nós acreditávamos na falácia sem ao menos nos perguntarmos por que aqui, prefeitos, governadores, senadores, presidentes das grandes empresas e inclusive da República eram e continuam a ser todos brancos em um país em que a população sempre foi majoritariamente negra? Existem várias teses para esta verdadeira
lavagem cerebral ocorrida aqui. Mas, sem dúvidas, os 20 anos que perdurou a ditadura militar foram fundamentais para o fortalecimento desta amnésia.

É só lembrar que durante o regime militar era proibido dizer que havia racismo no Brasil; aliás, qualquer ação, agrupamento ou manifestação que denunciasse práticas de racismo no território brasileiro poderia ser visto como um ato subversivo com risco de ser enquadrada na Lei de Segurança Nacional, uma lei criada para punir os desafetos do regime.

Foi nesse momento, arriscando a vida, que centenas de pessoas negras se juntaram nas escadarias do Teatro Municipal de São Paulo e, em 1978, em plena ditadura, ousaram desafiar o regime militar, saíram em protesto por conta da morte de um jovem negro pela polícia, surgindo aí o MNU – Movimento Negro Unificado, a mais importante instituição negra presente na redemocratização do país.

Nesses quarenta e cinco anos muitas coisas mudaram, a luta antirracista incorporou várias outras pautas da sociedade brasileira como as cotas raciais que depois foram estendidas para brancos pobres, virando cotas raciais e sociais nas universidades, outros avanços como pró-UNE, FIES, demarcação para terras quilombolas, e lei descrevendo o racismo como crime inafiançável, todas conquistas daquela geração que ousou desafiar o
obscurantismo, a policia e o racismo indo para as ruas.

Hoje, com as liberdades democráticas garantidas, a pergunta que se faz é: o que essa nova geração deixará para as futuras gerações? O que o ativismo digital, aquele do ar-condicionado e da tranquilidade da casa do papai e da contundência do youtube, facebook e instagram, está construindo, qual a ousadia desta geração? Pois, “ainda somos os mesmos e sofremos o racismo como nossos pais”.

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jornalista CEO e presidente do Conselho editorial da revista RAÇA Brasil, analista das áreas de Diversidade e inclusão do jornal da CNN e colunista da revista IstoÉ Dinheiro

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