MOMS MABLEY, A PRECURSORA DO STAND UP COMEDY
Saiba mais sobre a história da precursora do stand up comedy, Moms Mabley
TEXTO: Oswaldo Faustino | FOTO: Divulgação | Adaptação web: David Pereira
Sabe o que comediantes como Bill Cosby, Whoopi Goldberg, Richard Pryor e Eddie Murphy, entre muitos outros, têm em comum? Todos eles se inspiraram no trabalho de uma atriz nascida em 1894, na Carolina do Norte, e que teve uma infância marcada por tragédias até seguir carreira artística em Nova Iorque. Ela foi Loretta Mary Aiken, filha de James Aiken, um operário que também trabalhava como bombeiro voluntário, e da dona de casa Mary Smith, que montou uma pequena pensão – assim o casal pôde criar seus 16 filhos.
Um dos primeiros traumas da vida da menina foi a morte do pai, em consequência da explosão do carro de bombeiros, quando ela tinha 11 anos. Pouco tempo depois, Loretta também perdeu a mãe, atropelada e morta por um caminhão, no dia de Natal. Aos 14 anos, quando saiu de casa rumo a Nova Iorque, já havia sofrido dois estupros e, em ambos os casos, engravidou, deu à luz e entregou as crianças para adoção. Tinha tudo para ser uma pessoa amarga, mas reagiu e tornou-se, no início da década de 1920, uma das atrações do famoso Cotton Club. Ela própria se fez alvo de suas anedotas, como outros artistas do teatro de revista começaram a fazer. Estava nascendo ali o stand up comedy.
Saiba mais da carreira de Moms Mabley: Num tempo em que atrizes de teatro eram mal vistas – aqui no Brasil, por exemplo, eram obrigadas a registrar-se na Delegacia de Costumes, que cuidava das contravenções penais, como era o caso das prostitutas – Loretta chegou sozinha a Nova Iorque, sonhando em trabalhar no teatro. Graças a seu talento, sem grandes dificuldades, entrou para o vaudeville nova-iorquino,onde conheceu ator Jack Mabley, com quem namorou durante um período. “Ele me tomou muito e nada tinha para me dar. Tomar seu nome era o mínimo que eu podia fazer”, comentou, em 1970, numa entrevista à revista Ebony, explicando a adoção do nome artístico Jackie “Moms” Mabley, popularizado simplesmente como Moms Mabley.
Ela foi a primeira mulher a conquistar espaço no elenco principal do Teatro Apollo, no Harlem, a Meca do entretenimento afro-americano. Na década de 1960, seu sucesso na Broadway e também em clubes noturnos, no cinema e em séries de TV tornou-a uma das celebridades negras da época e a ajudou a vender centenas de milhares de cópias dos mais de 20 álbuns que gravou com base em seus stand ups, juntamente com canções.
Os assassinatos de Martin Luther King, no dia 4 de abril de 1968, e de Robert F. Kennedy, em 6 de junho do mesmo ano, dois árduos batalhadores pelos Direitos Civis dos afro-americanos, comoveram o mundo todo. O compositor Dick Holler escreveu uma bela canção a estes e outros dois outros crimes emblemáticos que vitimaram presidentes norte-americanos: o de Abraham Lincoln, em 1865, e John F. Kennedy, em 1963. Assim nasceu a canção folk rock “Abraham, Martin & John”, gravada primeiramente por Dion DiMucci, mas que foi celebrizada por Moms Mabley. Vários outros artistas de renome, como Marvin Gaye e Andy Willians também gravaram a canção.
Assim como encantava, Mabley também causava polêmicas e revoltava ativistas, que viam em seus personagens jocosos um desserviço para a luta pela autoestima das mulheres negras. Porém, fosse no palco ou em entrevistas, jamais deixou de denunciar o racismo. Politicamente incorreta, fazia piadas, iconoclásticas, falava mal de tudo e de todos, divertia-se zombando dos homens maduros e exaltando o vigor dos jovens. Na vida privada, porém, era lésbica assumida, desde os 27 anos, depois de ter se casado e gerado quatro outros filhos.
Moms Mable estava interpretando a protagonista em“Amazing Grace”, no final de 1974, quando sofreu um enfarto. Estava com 80 anos e aquele era seu segundo ataque de coração. Mesmo assim, conseguiu concluir as filmagens. Morreu em 23 de maio de 1975. A atriz Whoopi Goldberg estreou sua carreira de diretora de cinema com o documentário “Moms Mabley: I Got Somethin’ to Tell You”, ainda não distribuído para o Brasil. Aos que relutam em reconhecer a importância artística dessa mulher, basta deixar seu coração e mente se banharem com a aquela rouquidão a nos indagar: “Anybody here seen my old friend Martin Luther? Can you tell me where he’s gone…”.
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