Negros em conselhos das empresas, o início de uma realidade
A partir de 2026, companhias precisarão ter ao menos uma mulher e um membro de ‘comunidade minorizada’ no conselho ou alta liderança
A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) deu aval hoje às medidas propostas pela B3 para estimular a diversidade na alta liderança das empresas listadas.
Até 2026, as companhias em todos os níveis de listagem da bolsa terão de ter pelo menos uma mulher e um membro de “comunidades sub-representada” no conselho de administração ou na diretoria estatutária.
As regras foram colocadas em audiência pública pela B3 entre agosto e setembro do ano passado e receberam mais de 250 contribuições. Agora, com o aval do xerife do mercado, a bolsa lançou uma nova instrução, chamada de “Anexo ASG” para orientar os emissores.
Um dos aperfeiçoamentos no texto final em relação à proposta originalmente apresentada ao mercado foi a inclusão de pessoas indígenas na definição de comunidades minorizadas, que abrange ainda pessoas pretas, pardas ou indígenas, integrantes de comunidades LGBTQIA+ ou pessoas com deficiência.
Outra alteração é que o acúmulo das duas características (ser mulher e integrante de comunidade sub-representada) pelo mesmo administrador não será mais suficiente para o atendimento da regra.
O prazo para cumprimento será faseado. Até 2025, as empresas já listadas terão de ter pelo menos um membro diverso no conselho ou na diretoria, com os dois assentos contemplados no ano seguinte. As empresas que fizerem IPO têm até um ano após a listagem para se enquadrar.
O modelo é o conhecido como “pratique ou explique”: quem não cumprir a regra terá que se justificar no Formulário de Referência, documento regulatório entregue à CVM que é uma espécie de raio-x completo da companhia.
Mais do que impor sanções, a ideia é dar publicidade a esse tipo de informação e submetê-la ao escrutínio da sociedade e dos investidores.
Em nota, a diretora de emissores da B3, Flavia Mouta, disse que a mecânica do modelo de ‘pratique ou explique’ “é uma forma de dar maior transparência aos investidores e promover um avanço escalonado na diversidade das companhias brasileiras”.
Além da composição da alta liderança, o texto prevê também a inclusão de indicadores de desempenho ligados a temas ou metas ESG nas políticas de remuneração variável da administração, quando a empresa utilizar esse tipo de mecanismo.
Da mesma forma, as companhias já listadas precisarão atender a esse quesito a partir de 2025 ou explicar nos seus documentos porque não o fazem. Quem fizer IPO tem até um ano após a listagem para incluir a informação.
Cenário de diversidade
As regras da bolsa vão muito em linha com as da Nasdaq, aprovadas pela Securities and Exchange Commission (SEC) em 2021. O prazo de adaptação no caso da bolsa dos Estados Unidos varia entre 2 e 5 anos.
O Reino Unido, mais avançado na discussão, também adotou a abordagem de pratique ou explique, mas com uma abrangência maior. Por lá, os conselhos devem ter pelo menos 40% de mulheres e um integrantes não-branco, além de no mínimo um membro diverso na alta liderança.
Um levantamento feito pela B3 com os dados de 343 companhias listadas que entregaram seus Formulários de Referência até o último dia 20 de junho mostrou que 55% delas não têm nenhuma mulher entre seus diretores estatutários, e 36% não possuem participação feminina no conselho de administração.
Em relação aos dados de raça e etnia, 304 declararam não ter nenhuma pessoa parda na diretoria estatuária, e 310 não têm nenhuma pessoa parda no conselho.
A participação de pessoas pretas na alta liderança é ainda menor: elas não ocupam cargos de diretoria estatutária em 336 companhias e não estão nos conselhos de administração de 327 empresas.