O que a Comunicação Não-Violenta e esta singela coluna pretendem fazer?

A Tradição é uma matrona que nos guia em momentos de dúvidas. Com sua austeridade lapidada pelo tempo, agarra a nossa mão, nos ensina como garantir nossa necessidade de aceitação e sussurra aos gritos como devemos pensar e sentir. 

Sempre rotineira, toda paciência, ela prepara aquele lugar quentinho e previsível que nos protege da influência espevitada da Inovação, dada a confundir expectativas e ultrapassar limites pré-estabelecidos, o que nos torna alvos do julgamento e da vergonha. 

Pois é justamente essa conselheira que nos orienta a fazer uma pergunta universal a cada encontro que temos, fortuito ou planejado. Pergunta esta dita meio que distraidamente: “como vai você?”.

O que o rito não nos instruiu é escutar com o coração. Prova disso é que dificilmente quem ouve a pergunta protocolar encontra espaço para acolhimento e alívio. Pelo contrário, preferimos  sufocar o que sentimos e o que realmente somos. A sociedade é mesmo um baile de máscaras…

Nos dias atuais, realizar uma escuta ativa nos encontros já tão complicados da vida parece uma proposta inviável. Ocorre que, em meio a tanta surdez, uma outra pergunta emerge: “numa sociedade mais atenta às dores alheias teríamos um cotidiano tão conturbado?”. Não se sabe até que se tente. 

Gratidão

Esta coluna é para isto: apontar as estruturas de dominação que nos ensinaram a dividir o mundo entre certo e errado, mocinho e bandido, claro e escuro. Suas lições nos fizeram repetir que aqueles do lado dito “certo” merecem afago. Já aos párias, alternativos, diferentes, diversos, minorias que não se enquadram, ou maiorias desprezadas como negros e mulheres, cabe a punição por não cumprirem seu papel. Negros se conformam. Mulheres se limitam. Crianças se calam. Velhos se recolhem. Assim é que a paz reina.  

Para essa tarefa nos apoiaremos nos princípios da Comunicação Não-Violenta (CNV), uma propositura do doutor em psicologia e mediador de conflitos em zonas de guerra Marshall Rosenberg (1934-2015). Para ele, a atribuição de culpa é uma das formas mais poderosas de se dominar. Rosenberg organizou e aprimorou a CNV inicialmente em escolas estadunidenses que tentavam superar a infame segregação racial nos anos 1960. Ele se inspirou nos ideais de Luther King, Gandhi e Paulo Freire, como veremos em textos futuros. 

Espero que esta coluna fortaleça todos que acreditam ser possível viver num mundo em que atender as necessidades de todos não seja uma utopia, mas sim um exemplo que a Tradição pode começar a ensinar pelos séculos vindouros.

Desde já, com muita alegria, expresso gratidão à Revista Raça pela abertura deste espaço, que contribui com a minha necessidade de propósito, de realizar projetos que acredito. Desde antes de me graduar como jornalista em 2009 já acompanhava com admiração o trabalho deste periódico consagrado na imprensa brasileira. Um viva à busca pela igualdade racial e pela diversidade!

*Fábio Pereira é jornalista, mediador de conflitos e facilitador de Comunicação Não-Violenta (CNV). Integra a ONG CNV em Rede e coordena a Câmara de Mediação Pacific

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Jornalista e mediador extrajudicial com especialização em conflitos familiares e oficinas de parentalidade pelo Instituto Brasileiro de Mediação Familiar. É facilitador de Comunicação Não-Violenta (CNV), colaborando com a ONG CNV em Rede e integrando o banco de facilitadores desta disciplina na Escola Nacional de Administração Pública (ENAP). É colunista de CNV da Revista Raça.

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