Pelé: A perfeição é uma meta

POR ZULU ARAUJO

A única palavra que poderia definir a trajetória de Edson Arantes do Nascimento no futebol seria: perfeição. Sim, Pelé era absolutamente perfeito dentro das quatro linhas. Um atleta na acepção da palavra. Chutava bem com as duas pernas. Cabeceava com precisão. Possuía uma impulsão fenomenal. Driblava com maestria tanto à direita quanto a esquerda, correndo ou parado e ainda se dava ao luxo de ser um excelente goleiro. Não foi a toa que foi considerado, adorado, incensado e idolatrado como o maior jogador de futebol de todos os tempos.

Mas, Pelé era um ser humano, assim como qualquer um de nós, e por isso mesmo passível de todas as virtudes e falhas que qualquer ser humano possui. Mas, havia algo que diferenciava Pelé do mundo em que ele nasceu e viveu – Pelé era negro, num pais e num mundo que escravizava negros/as. E exatamente por isso, ele nunca foi perdoado por ter rompido essa barreira. Nem os racistas, preconceituosos invejosos ou simplesmente “gente de bem” nunca o perdoaram por ele ser um sucesso, um exemplo e um ícone. Ele foi roubado, vilipendiado, discriminado e até mesmo desprezado por aqueles a quem ajudou a ficar milionários, a exemplo dos “cartolas” do futebol brasileiro e a própria Fifa.

Acompanhei a trajetória de Pelé nos campos de futebol desde os seus 17 anos. Era seu fã. Adorava seus gols sensacionais. Por muitas vezes na juventude, fui chamado pelo seu apelido e o recusei, porque via na expressão de quem assim me tratava certo desdém para com aquilo que Pelé representava. E também, por não me considerar a altura do seu significado. Aquilo soava para mim, como se fosse mais um “neguinho” que deu sorte e não alguém que tinha talento, como o Pelé. Ou seja, Pelé incomodava mesmo sendo o padrão de humildade que todos esperavam de um negro pobre no Brasil. O problema na verdade é que ele tinha dado certo.

No período da ditadura tentaram a todo custo imputar a Pelé as responsabilidades de um Salvador da Pátria no plano da política ao tempo que se passava pano ou era conivente com os verdadeiros responsáveis pela tragédia que se abateu sobre o país durante 21 anos. Queriam responsabilizar Pelé pelos maus feitos de uma elite escravocrata e arrogante que escravizou de forma brutal milhões de semelhantes ao Rei do futebol ao longo de quase quatro séculos.  

Pelé resistiu e conseguiu sobreviver a tudo e a todos e continuar reinando no imaginário de milhões de neguinhos brasileiros como exemplo de que o impossível existe e pode ser realizado. Durante anos, continuou sendo o  símbolo e o caminho a ser seguido por todos aqueles que sonhavam por dias melhores e tinham no futebol a sua única esperança.

Mas, como Pelé era de carne e osso, um ser humano como outro qualquer, foi alcançado pela inevitabilidade da vida – a morte. Como um bom jogador, resistiu, driblou, fez manha, catimbou, mas não teve jeito e a era Pelé chegou ao fim. Que a terra lhe seja leve e que os sonhos que embalou a vida de tantos dos nossos se transforme em realidade, já agora, alicerçados pela consciência de que a igualdade não é uma dádiva de Deus, mas um direito a ser conquistado no dia a dia, com muita luta e energia.

Como diria Gilberto Gil em sua antológica canção, intitulada – “Meio de Campo” – “A perfeição é uma meta, defendida pelo goleiro, como eu não sou Pelé, nem nada, eu sou apenas um tostão”, te mando um grande abraço apertado daquele sempre o admirou.
Toca a zabumba que a terra é nossa!.

Comentários

Comentários

About Author /

Start typing and press Enter to search

Open chat
Preciso de Ajuda
Olá 👋
Podemos te ajudar?