Preta Gil fala sobre a discriminação por causa do seu corpo

Confira na edição 187 nossa matéria de capa com trechos da entrevista com a cantora Preta Gil

 

TEXTO: Maitê Freitas | FOTOS: Fernando Torquatto e Divulgação | Adaptação web: David Pereira

 

Preta Gil fala sobre a discriminação por causa do seu corpo | FOTO: Fernando Torquatto/Divulgação

Preta Gil fala sobre a discriminação por causa do seu corpo | FOTO: Fernando Torquatto/Divulgação

 

Preta Maria Gadelha Gil Moreira, também conhecida por Pretinha, Nega, Maria ou simplesmente Preta Gil, aos 39 anos, mostra a que veio e que não é só uma cantora que pegou carona na carreira do pai, o músico Gilberto Gil. Com o pai e com a mãe, Sandra Gadelha, aprendeu a dividir o espaço desde cedo com os primos e os sete irmãos, contrariando todos os boatos de que não passa de uma mimada. “Tive uma educação liberal que me ensinou a amar e a respeitar todos e tudo”. Cresceu tendo como companhia os tios Caetano Veloso, Maria Bethânia e, como madrinha, a cantora Gal Costa, de quem ganhou os primeiros paetês. “Meu lado travesti veio da minha madrinha”, conta.

Em 2003, quando lançou o primeiro disco “Prèt-a Porter”, ela abalou os moralistas de plantão ao posar nua, dar entrevistas assumindo experiências bissexuais e ter um corpo que fugia dos padrões de beleza. Bem resolvida com suas curvas, a cantora levanta a bandeira em defesa da não-padronização do corpo feminino, lançando campanhas de moda “plus size”.

Com onze anos de carreira musical e uma trajetória que inclui a gravação de cincos CDs, atuação em cinema, novela e apresentação de programas, a “polêmica” Preta Gil, como é vista por alguns, mostra que é versátil e obstinada pelo trabalho: “tiro quinze dias de férias por ano”, revela, sem tom de pesar.

Desde 2007, é ícone do carnaval de rua carioca, levando mais de um milhão de pessoas ao Bloco da Preta, lotando as casas de shows com a Noite Preta. Faz shows do norte ao sul do país e seu público inclui gays, lésbicas, magros, gordinhas, heterossexuais, e vai da classe alta carioca ao subúrbio. “Tem espaço para todo mundo se divertir”, afirma a cantora.

“Preta é como uma egrégora, ela é um estado de ser”, diz seu produtor Horacio Brandão. A cantora, que levanta várias bandeiras em prol das mulheres, das gordinhas, dos negros e dos homossexuais, tem como principal mote o respeito à diversidade.Ela é “boca dura”. Ela é versátil. Ela é única. Ela é a toda boa: Preta Gil! Veja trechos da entrevista com a a cantora Preta Gil.

Quem é a Preta Gil?

Uma mulher de quase quarenta anos que viveu a primeira metade da vida intensamente, amadureceu a cada ano. Uma mulher que soube viver todas as experiências de maneira bem vivida. Mãe, filha, empresária, artista, negra e guerreira, que aprendeu a respeitar tudo. Sou negra, sou índia, sou uma mulher que foi criada com amor e que ama o que faz.

No início da sua carreira, criou-se uma imagem sua como sendo uma artista polêmica. Da “Preta polêmica” à Preta de hoje, o que mudou?

Eu sou a mesma Preta, acredito e busco os mesmos ideais. Sempre fui o que sou. Alguns veículos da imprensa criaram essa “Preta polêmica”, hoje em dia o meu público sabe quem em sou e é isso que interessa. Poucas coisas aconteceram e muitas vezes criaram rótulos e factoides que não são reais. Sempre fui verborrágica, boca-dura, falei e falo o que penso e acredito, isso gerou muito estranhamento. O meu nome e a minha imagem são muito fortes, no entanto, essas coisas nunca me anularam, me fortaleceram. Precisei trabalhar dentro de mim e amadurecer. Não vai ser uma piada de mau gosto que vai me parar.

 

"Tenho o corpo da mulher brasileira, um corpo com curvas, natural e não pasteurizado" | FOTO: Fernando Torquatto

“Tenho o corpo da mulher brasileira, um corpo com curvas, natural e não pasteurizado” | FOTO: Fernando Torquatto

 

Cantora, atriz, apresentadora de TV e empresária. Essa versatilidade e experimentação dá autenticidade ao seu trabalho?

A experiência faz com que tenha uma gestão clara da minha carreira, me dá sabedoria. Não estou num pedestal, tenho uma pró-atividade. Não fico sonhando com o inatingível, participo do trabalho braçal junto com a minha equipe. Dá trabalho, mas não é um problema pensar em produção, saber quanto custa fazer, montar e colocar um show nos palcos, colocar o bloco na rua, gravar um DVD… Isso agrega, faz com que o meu trabalho tenha a minha cara. Eu me experimento e isso é muito bom, ser esporadicamente atriz, apresentadora. Em 2011, gravei o filme “Billi Pig”, dirigido pelo José Eduardo Belmonte, foi uma delicia. Dentro de todas as coisas que sou, sou em primeiro lugar mãe e cantora, e todas as outras coisas acrescentam e fortalecem a minha trajetória.

Você tem um corpo que foge dos padrões e já passou por situações de discriminação e de ser taxada… Como é isso?

Tenho o corpo da mulher brasileira, um corpo com curvas, com volume, um corpo natural e não pasteurizado. Essa história de plus size é muito louca, quando você percebe que ter um corpo natural e ser o que é não tem espaço no mercado. As mulheres deixaram de querer viver na inércia e nos padrões, essa é uma das bandeiras. Eu sempre assumi o meu corpo, posei nua e fui criticada, virei tema de piada. Quando eu levantei essa bandeira, isso não existia. Essa pasteurização do corpo é seria, chegar numa loja e ver que os tamanhos que “fogem do padrão” estão numa parte afastada é muito sério, mexe com a autoestima Eu sofri muito com isso, tomei remédio e quis emagrecer a todo custo, me fizeram acreditar que ser gorda era feio. Demorou para eu me aceitar, hoje compreendo que sou o que sou, o meu corpo é o corpo de muitas brasileiras, é natural.

Você costuma dizer que a música brasileira vai de Chico Buarque a Perla. Explica pra gente, Preta.

Tenho um ouvido sem preconceitos para MPB. Eu tenho a sorte de ser carioca e baiana ao mesmo tempo. Sempre fui ao samba no Cantagalo, no Rio, e vi nascer o axé music, um mix de elementros tropicalistas com a música pop. Sempre ouvi de Genival Lacerda a Jackson do Pandeiro. Adorava As Frenéticas, elas eram transgressoras. O que mudou dos cantores e grupos daquela época para hoje? Nada. O Brasil é um país plural, múltiplo. Temos que afirmar esse dom e diversidade. Hoje em dia, temos a Anitta que resgata o pop, Clarice Falcão que traz humor, o pessoal do hip-hop: Criolo, Emicida, Karol Conk… Para mim, a Stefhany (cantora piauense) é transgressora, inteligente. Quando a conheci, ela era uma menina que reafirmou a cultura do tecnobrega com influências norte-americanas. Quando conheci a Gaby Amarantos, me impressionei com a força dela. Eu canto de tudo porque gosto.

Quer ver essa e outras entrevistas e reportagens da revista? Compre essa edição número 187.

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