Publicitários negros disputam diretoria do Clube de Criação

Em novembro de 2003 foi sancionada a Lei n. 12.228 que instituiu o Estatuto da Igualdade Racial, um marco no processo de reparação, enfrentamento ao racismo e promoção da equidade racial no Brasil. Mas, as letras parecem não ser suficientes para enfrentar tal situação que há séculos coloca pessoas negras e de outros grupos étnico-raciais em desvantagem no País. É preciso vontade política, programas e a ação articulada da sociedade. 

Dezoito anos depois da publicação do Estatuto da Igualdade Racial, publicitários negros e negras parecem buscar alternativas para a aplicação da lei ao lançar, pela primeira vez, uma chapa para a disputa da direção do Clube de Criação, uma entidade de relevância para a publicidade brasileira.

Cabe destacar que o Estatuto da Igualdade Racial dedica um capítulo inteiro para aos “Meios de Comunicação” e orienta no Artigo 43, que “a produção veiculada pelos órgãos de comunicação valorizará a herança cultural e a participação da população negra na história do País” e acrescenta ainda que isso vale para produção de filmes, programas para televisão, cinema e peças publicitárias. O documento vai além e determina “[…] obrigatoriedade da prática de iguais oportunidades de emprego para as pessoas relacionadas com o projeto ou serviço contratado”. 

Com o slogan, “Diversidade alimenta a criatividade”, a Chapa Preta não só se lança em uma disputa difícil e necessária, como também faz uma dura crítica ao filme lançado pelo Clube de Criação para divulgar o Festival 2021, intitulado “Crise. Crie”, por uma abordagem, no mínimo equivocada ao se referir ao movimento Black Power como resultado criativo frente à Ku Klux Klan. 

Os e as integrantes da chapa se mostram confiantes e declaram que independe de ganhar ou não a eleição, existe um impacto inequívoco na própria candidatura, porque o movimento deles têm gerado apoio de grandes agências e profissionais e que do debate gerado em torno da existência da Chapa Preta mostram que esse tipo de impacto já está acontecendo. “Isso é algo que não pode mais ser apagado, está na história”. 

Joana Mendes, presidenta da chapa, disse que “disputar a diretoria do Clube de Criação é uma forma de enriquecer culturalmente a propaganda e fomentar diálogos com os vários grupos da sociedade, desde marcas, agências, profissionais autônomos e a sociedade civil, que pode encontrar na propaganda uma representação positiva”. Ela acredita que o mercado está maduro e, que se vencerem encontrarão ressonância entre os/as criativos/as. “O criativo é, antes de mais nada, um profissional curioso e sempre atento. É um caminho natural de convergência entre o que o mercado espera e o que a Chapa Preta pode oferecer, porque o que queremos fazer é agregar propósito e tornar o Clube ainda mais relevante”.

O mercado, de fato, está aquecido. A produção publicitária está começando a enxergar efetivamente o público negro, LGBTQIA+ , indígena e feminino como público consumidor e mais que isso, que merece ser retratado, com respeito, na publicidade. Mas, ao mesmo tempo, os esquivos seguem acontecendo e em escala superlativa, como foi o caso do filme de divulgação do Festival 2021 produzido pelo próprio Clube de Criação em parceria com a Wieden + Kennedy São Paulo.

Por certo, com experiência, eu posso afirmar que a chave para essa mudança está na inclusão equitativa e equilibrada desses grupos nos espaços de tomada de decisão, como na direção do Clube de Criação e outras instituições que pautam a produção de conteúdo e narrativas no país.