Estados Unidos contra Billie Holiday, de Lee Daniels
Ninguém melhor que Billie para cantar a tristeza. Aquela tristeza que te coloca em pé e te faz seguir em frente. Essa foi a sensação que me percorreu enquanto assistia o filme “Estados Unidos contra Billie Holiday”, dirigido por Lee Daniels, estrelado por Andra Day, no papel de Billie, e disponível na Amazon Prime Video.
O filme, lançado em fevereiro deste ano, entrega uma trilha sonora de primeiríssima qualidade e não poderia ser diferente, já que estamos falando de Billie Holiday. Além disso, apresenta uma fotografia digna de Oscar, na minha opinião. É uma história de perseguição, fragilidades, forças, resiliência e de um compromisso de alma com a música e com o enfrentamento ao racismo. Algo que o diretor, de outra forma, já tinha apresentado quando lançou, em 2009, Preciosa.
Billie, interpretada por Andra Day, é imbatível mesmo no fim. Ela enfrenta uma rede de conspiração e abuso cujo objetivo é calar a cantora, a mulher e a ativista. Ela não permite que isso aconteça e decreta: os seus netos vão cantar “Strange Fruit”.
O diretor, com destreza, deixa nítido os objetivos “reais” que levam a cantora de jazz aos tribunais por mais de uma vez: a interpretação inconfundível e a instência em seguir cantando “Strange Fruit”, música que narra o linchamento de pessoas negras nos Estados Unidos.
“Árvores do sul produzem uma fruta estranha
Sangue nas folhas e sangue nas raízes
Corpos negros balançando na brisa do sul
Fruta estranha pendurada nos álamos”.
Não há meias palavras. A primeira estrofe, descrita acima, e as subsequentes narram os frequentes linchamentos que terminavam com pessoas negras penduradas em árvores. Uma mulher linda, com um voz incrível, cantando isso na década de 1940 certamente levaria a fúria de um Estado racista. Foi exatamente isso que aconteceu e é o que sustenta a narrativa do filme.
Sugiro assistir até o fim. Até depois dos crédito.. E se deixe levar por inteira/o, como Billie, ao interpretar “All of me”.
Jornalista com experiência em gestão, relações públicas e promoção da equidade de gênero e raça. Trabalhou na imprensa, governo, sociedade civil, iniciativa privada e organismos internacionais. Está a frente do canal "Negra Percepção" no YouTube e é autora do livro 'Negra percepção: sobre mim e nós na pandemia'.