“São todos bandidos”, eles dizem
Um policial branco imprensa contra o chão o pescoço do homem negro que, já imobilizado, repete inúmeras vezes a frase: “Não consigo respirar!”. George Floyd foi assassinado por asfixia a céu aberto, em via pública, em pleno dia. E tudo foi filmado, fotografado e gravado.
As imagens revoltantes viralizaram e a frase, “NÃO CONSIGO RESPIRAR”, virou um grito de guerra contra o racismo. Mas, não é a primeira vez que essa mesma frase antecipa a morte de pessoas negras pelo sistema racista no mundo.
Enquanto escrevo esse texto, um misto de sentimentos e questionamentos toma conta da minha cabeça e do meu coração gerado pela indignação com situações injustas praticadas contra nós, negros, pobres e indígenas.
A morte de Floyd reverberou em uma série de protestos de chamas acessas e revoltas explodiram pelo mundo demonstrando inconformismo e dando continuidade às lutas antirracistas. São tantas as mortes de pessoas negras que já não conseguem mais esconder essa prática que alimenta o ódio e o racismo sistêmico. CHEGA!
Hoje, se o racismo e o preconceito são debatidos abertamente mundo afora isso é fruto de uma luta árdua e longa.
Na sociedade brasileira, em que boa parte da elite parece não se incomodar, e alguns até demonstram simpatia, o racismo estrutural fica evidente na maneira de como pretos que habitam as comunidades são tratados. Um povo sujeito ao descaso e à invisibilidade impostos pela sociedade.
Se houver algum problema que envolva a necessidade da ação policial nas favelas, na maioria das vezes, a pessoa suspeita já é passiva de morte, como vimos recentemente na favela do Jacarezinho, no Rio de Janeiro.
Lá e em todo o Brasil, a violência policial é uma realidade dura nas comunidades. Isso é inegável! Ignora-se que a imensa maioria das favelas é de cidadãos comuns, trabalhadores, que têm seus direitos desrespeitados simplesmente por serem pretos e pobres. Casas são invadidas, suspeitos são executados, inocentes ficam à mercê. Ninguém é considerado cidadão! “São todos bandidos”, eles dizem. E essa é a desculpa repetida para dormirem com suas consciências tranquilas.
Essa sociedade racista caótica nos deixa em estado de choque. Minhas palavras também chocam, mas falo de uma realidade que vivemos há centenas de anos. Nós, negros, vivemos em estado de choque o tempo todo, por medo. A vida da maioria do povo preto é um alerta constante.
Pensam em manter o preto e pobre das periferias nas favelas, mas nós estamos de saco cheio! Queremos o direito à ascensão social e financeira de maneira justa. Temos direito à necessária reparação.
Historicamente, aos senhores de engenho o Estado pagou indenização pelo ‘prejuízo’ com a malfadada abolição da escravatura, em que a liberdade veio acompanhada de várias recessões ao povo negro dilacerado. Não sendo oferecida nenhuma condição para sobreviver, jogados pelas sarjetas. Mas nossos antepassados fizeram o milagre e nós estamos vivos e querendo a reparação. O Estado brasileiro nos deve e, ainda que uns não queiram, nós estamos ascendendo.
Precisamos entender que temos força e poder de mobilização da opinião pública. Existe uma luta com inteligência e competência sendo travada. A nova geração de jovens negros e negras são competentes empresárias e empresários e amam as tecnologias. Estamos diante de uma nova geração potente!
A morte de George Floyd e a de outros tantos homens e mulheres negras e negros nos dá um sinal vivo de que é preciso virar o jogo. Somos a maioria no país, mas a minoria nos postos de comando e na política já que apenas 17% entre os 580 senadores e deputados federais são pretos. É uma lástima pois significa que não estamos elegendo pessoas iguais a nós. Ora, pensemos: se usam a cor da nossa pele para nos discriminar, então que a usemos para eleger os nossos e os que têm maior possibilidade de nos representar.
Estamos cansados de apanhar e morrer. Por isso, precisamos dar poder aos nossos ou iremos continuar morrendo sufocados de dor e revolta e vendo nossos jovens negros e negras abatidos gritando: “NÃO CONSIGO RESPIRAR”.
VIDAS NEGRAS IMPORTAM.