Casos de racismo
Confira alguns casos emblemáticos de racismo pelo Brasil e contra brasileiros pelo mundo
TEXTO: Sueli Carneiro* | Adaptação web: David Pereira
CRIANÇA EM SP
Um casal de espanhóis em viagem pelo Brasil acusou um restaurante em São Paulo de racismo contra seu filho de seis anos. O menino negro, adotado há dois anos na Etiópia, foi expulso do estabelecimento após ser confundido com um garoto de rua. Os pais o deixaram na mesa enquanto se serviam no bufê. “Um senhor me botou para fora”, disse o garoto, que foi encontrado pelos pais a um quarteirão do restaurante, assustado e chorando. De acordo com o boletim de ocorrência registrado no 36º Distrito Policial, inicialmente, os funcionários negaram a expulsão. Depois, o gerente do restaurante explicou que, como era dia de feira, muitas crianças de rua vão ao local pedir comida e, como o menino (único negro no local) não respondeu nada ao ser abordado, foi retirado do restaurante. Detalhe: o garoto, de origem etíope, não fala português! A notícia se espalhou rápido, gerando uma série de manifestações na internet e em frente ao local.
JANUÁRIO ALVES
O técnico em eletrônica, Januário Alves de Santana foi espancado com cabeçadas, esganaduras, coronhadas e socos por seguranças de um hipermercado em São Paulo, após ser confundido com um assaltante. Enquanto a família fazia compras, Januário aguardava em seu carro – um EcoSport – com a filha de dois anos. Ao lado, o alarme de uma moto disparou e Januário saiu de seu veículo quando percebeu dois homens correndo. O dono da moto chegou em seguida e logo vieram os seguranças do local. E o martírio começou. “Eles falaram que eu ia roubar a moto e o EcoSport. Quando disse que o carro era meu, batiam mais.” Três policiais militares chegaram ao local, e Januário explicou que seus documentos estavam no carro. “Eles riam e diziam: ‘impossível um neguinho ter um EcoSport, sua cara não nega. Você deve ter pelo menos três passagens pela polícia’”. De tanto insistir, foram até o automóvel. Após conferir a documentação, os policiais foram embora. Januário foi indenizado pelo hipermercado e afirmou já ter passado por outros constrangimentos por causa do carro.
THALMA DE FREITAS
No Rio de Janeiro, a atriz e cantora Thalma de Freitas foi abordada por policiais militares na Avenida Niemeyer, próximo de um dos acessos ao Morro Chácara do Céu, no Vidigal, quando deixava a casa de uma amiga. Durante a ação da PM, a atriz mostrou os documentos e tirou todos os objetos da bolsa, colocando-os no capô da viatura. Mesmo não encontrando nada, dois policiais disseram que Thalma era suspeita e a levaram para a delegacia para que fosse feita uma revista, pois não havia policiais femininas durante a abordagem. “A delegada não me obrigou, mas fiz questão de ser revistada pela policial feminina. “É a primeira vez que passo por essa humilhação. Não há outra coisa a fazer exceto processá-los por abuso de poder. Por que a loura que estava sendo revistada antes de mim não veio para cá? Será que artistas como eu e moradores do Vidigal, negros como eu, precisam passar por isso? Será que temos que ter medo da polícia? Por que estou aqui? Sou suspeita de quê? Gostaria que eles me explicassem”, desabafou Thalma.
SEU JORGE
Em entrevista concedida ao produtor Van Damme, no estúdio da Beat98, o cantor falou sobre sua estada de seis meses na Itália, onde foi fazer a trilha sonora de um filme em Cinecittá, a meca do cinema italiano. Ele conta, entre outras coisas, que certa vez entrou em uma loja de instrumentos musicais (isso depois de vencer a desconfiança do vendedor, que o questionava e o olhava ‘diferente’), porém, foi ‘orientado’ a deixar o carrinho de bebê onde estava sua filha de pouco mais de um ano do lado de fora. Para o vendedor, ali não estava uma criança e sim um monte de lixo. “Foi lá que eu conheci pela primeira vez o racismo. O preconceito eu já conhecia, mas ele é mais fácil de desmontar… Aquilo magoou mesmo, o olho encheu d’agua, apertou o coração”, disse o brasileiro. O áudio da entrevista completa (e surpreendente) pode ser conferido em vários sites na internet, entre eles, o Geledes (www.geledes.org.com)
*Sueli Carneiro é filósofa e doutora em Educação pela Universidade de São Paulo (USP). Fundadora e coordenadora executiva do Geledés Instituto da Mulher Negra, é diretora vice-presidente do Fundo Brasil de Direitos Humanos e ativista do Movimento Feminista e do Movimento Negro do Brasil
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