História da cantora Rita Ribeiro
Veja a história da cantora maranhense, Rita Ribeiro
TEXTO: Maitê Freitas | FOTOS: Alexandre Moreira | Adaptação web: David Pereira
Estou de frente para o mar em Copacabana, olhando esta beleza que é o Rio de Janeiro”. Com esta frase, Rita começou a entrevista por telefone. Nascida na cidade de São Benedito do Rio Preto, no interior do Maranhão, há dez anos a cantora de voz singular circula pelo país e pelo mundo com o show Tecnomacumba, trabalho que, além de premiá-la, contribui na luta pelo respeito às tradições religiosas afrobrasileiras.
Cantora desde os 15 anos, Rita sempre assinou como Ribeiro, contudo, uma abertura de processo para registro do nome por uma homônima fez com que Rita trocasse Ribeiro por Benneditto. Com Benneditto, Rita presta homenagem ao pai, Fausto Benedito Ribeiro, à cidade natal e ao santo negro. Nas palavras da cantora: “Ribeiro já não me cabia mais. O meu trabalho e a minha história vão além de um processo por registro de marca. Toda mudança é para melhor, é positiva. Gosto da dualidade e complementariedade do masculino e feminino, do Rita e do Benneditto. O público aceitou, quer me ouvir. São Benedito e todas as manifestações divinas que levam seu nome estão me abençoando”.Vestida de vermelho, com os cabelos dourados e acompanhada de três músicos, a cantora maranhense, após alguns anos sem vir para São Paulo, retornou no final de janeiro à metrópole em show realizado no SESC Pinheiros, onde interpretou seus principais sucessos, levando o público ao êxtase. Tingindo o teatro de vermelho, Rita, que se auto define “ecumênica e universalista”, evocou a tradição e a ritualística em louvor às africanidades que habitam a identidade brasileira cantar a chegança que estará em seu encanto: “quer vir comigo me espera, eu estou na beira do mar tocando tambor de mina, venho das bandas de lá”.
Prestes a lançar seu sexto disco, “Encanto”, Rita Benneditto dá continuidade à pesquisa e à união das sonoridades tradicionais com elementos modernos, e resgata a tradição musical maranhense unindo as guitarras e as batidas eletrônicas. “O Encanto sublima o Tecnomacumba, faço reverência a minha terra, onde aprendi tudo o que sei. Como artista, tenho o compromisso de manter essas tradições vivas”, disse. Além de dar novas melodias às músicas tradicionais, Rita regravou “Extra” de Gilberto Gil, e “Fé”, de Roberto Carlos, além da inédita “O que é dela é meu”, feita para ela, pelo sambista Arlindo Cruz.
Rita despontou no cenário da música popular brasileira como uma das principais cantoras maranhenses. Parceira de Chico Cesar, Vander Lee e Zeca Baleiro, tornou-se conhecida ao gravar “Mamãe Oxum”, canto de domínio público que ganhou novas batidas e se popularizou nas festas especializadas em tocar música brasileira. Seja na batida ou na referência poética, os elementos em referência à liturgia afrobrasileira sempre estiveram presentes na música popular brasileira e em seus variados gêneros. Há dez anos circulando com o show Tecnomacumba, Rita explica a adesão do público: “É um trabalho que inova ao recuperar e resgatar os elementos que Clara Nunes, Clementina e tantas outras cantoras tornaram públicos: tiramos a memória festiva da religião afrobrasileira de debaixo do tapete. Não tenho a pretensão de levantar nenhuma bandeira, os grupos e federações do Candomblé e da Umbanda fazem isso”.
Se por um lado a cantora não pretende levantar a bandeira contra a intolerância religiosa, ao longo desses dez anos circulando com o álbum que referencia os orixás deparou-se com situações onde a intolerância e o preconceito foram evidentes. “Uma vez, durante show em Petrópolis (Rio de Janeiro), um grupo de evangélicos fez um círculo em volta do teatro em exorcismo ao show. Com o Tecno tive alguns contratos negados com parceiros da gravadora depois que lancei o show. Eu acho que essa concepção de Deus é relativa. A intolerância está tomando uma dimensão absurda, já passamos desse processo de inquisição e controle da mente. A minha religião é a música, é para ela que eu bato cabeça todo dia. Tecnomacumba é um show em homenagem à cultura, à religião afrobrasileira, com a ressignificação e o tratamento estético. A música é a única deusa, entidade que consegue estar em todos os lugares, em qualquer tempo e espaço”, desabafa.Quando sobe no palco, Rita inunda a plateia com força e vitalidade, sua voz vibrante reitera a precisão dos gestos e das batidas tradicionais afrobrasileiras. “Sou uma bailarina que dança todas as manifestações”, diz. Nascida numa família matriarcal, a cantora se orgulha ao falar da presença feminina em sua vida: “Nasci de uma mãe filha de Iansã, tenho nove irmãs. Aprendemos a ter noção de valores, nós nos reverenciamos. A mulher é um ser sagrado que gera vida, energia e cria. Sou apaixonada pelas energias femininas”.
Atualmente moradora do Rio de Janeiro, a cantora já viveu em São Paulo, onde, segundo ela diz, passou a olhar verticalmente, com desconfiança e frieza. “Sampa é a minha segunda casa, onde eu aprendi a assimilar elementos da urbanidade que eu não tinha”. Mas Rita assume que suas relações com o Maranhão não estão presentes apenas na sonoridade de seus discos, mas também no engajamento da arte como meio de conscientização política. “O Maranhão é a minha matriz, é o meu porto seguro. Vivemos sob o domínio de uma família há 40 anos, que não se preocupou durante todos esses anos em cuidar da terra. A cidade cresceu. Cresceu de maneira desordenada, devastaram a mata, exploram as mulheres, as crianças, existe uma quantidade enorme de pessoas muito ricas e de pessoas muito pobres, desproporcionalmente. Eu faço um apelo ao povo e aos artistas maranhenses: tenham consciência ao eleger. Os Sarneys são uma síndrome maléfica. Eu sou uma andorinha que sozinha não faz verão. Uso meu trabalho para levar o que o Maranhão tem de melhor e mais rico, que é a sua tradição cultural. Trabalho na preservação e manutenção da cultura maranhense”, afirma.
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