O negro na ditadura militar

No ano em que lembramos os 50 anos do golpe que instaurou uma ditadura militar no Brasil veja a participação do negro na militância contra a ditadura

 

TEXTO: Daniel Keny | FOTOS: Divulgação | Adaptação web: David Pereira

Cartaz do filme “Onde Está Osvaldão?” | FOTO: Divulgação

Cartaz do filme “Onde Está Osvaldão?” | FOTO: Divulgação

Entre tantas vidas perdidas, pouco se fala das vitimas negras da ditadura. Muitos dirigentes e guerrilheiros negros ficaram no limbo. Quem conhece a história de Osvaldão, que lutou bravamente no Araguaia? Ele foi a gura mais emblemática da guerrilha, e além das habilidades físicas e do porte atlético, foi descrito como um homem generoso e de grande coragem por quem conviveu com ele. Na região do Araguaia, até hoje é tido como herói, mas sequer aparece nos livros didáticos quando o assunto é ditadura e, ao contrário de vários militares, seu nome não intitula nenhuma escola pública.

Apesar do destaque, Osvaldão não é o único ocultado, conforme destaca o diretor e editor da Afropress, Dojival Vieira. “Durante os anos de chumbo, houve a resistência armada ao regime militar. Naquela época, muitos foram presos, torturados e mortos. Hoje, ainda são mais de 400 pessoas desaparecidas. Como a luta contra o regime foi constituída principalmente por organizações guerrilheiras brancas, ou seja, a classe média branca urbana, pouco se fala e se lembra que a participação dos negros foi muitos importante. Muitos deram as vidas pela democracia e poucos são lembrados. Por exemplo, Osvaldão, Carlos Marighella, que era filho de um imigrante italiano com uma negra descendente de escravos, Luiz José da Cunha, o Comandante Crioulo, entre outros.

Existe uma lacuna histórica a ser preenchida, senão as gerações futuras continuarão com a ideia de que luta contra a ditadura foi travada unicamente pelos brancos”, afirma. Em 1978, a repressão feita sobre a imprensa, os sindicatos e os movimentos políticos ainda era violenta. Na região do ABC, João Rodrigues da Silva, então presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de Santo André, um homem honesto e trabalhador, acabou morto quando saía de uma reunião sindical, onde havia decidido deflagrar uma greve. Como em centenas de outros assassinatos de brasileiros que lutavam por um país melhor, até hoje não se sabe quem cometeu o crime.

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Dinalva Oliveira Teixeira, uma guerrilheira do Araguaia | FOTO: Divulgação

O caso de Santos Dias é mais um que simbolizou a truculência do regime militar. Visto como um homem tranquilo, atuava no movimento operário e era engajado em diversos agrupamentos sociais que visavam melhorias comuns. No começo dos anos 1960, acabou expulso do campo de sua cidade natal, Terra Roxa, São Paulo, devido a sua atuação social. Na capital, passou a trabalhar como ajudante geral em uma fábrica e participava da pastoral operária. Já como inspetor de qualidade da Filtros Mann, em 1979, pouco depois da promulgação da Lei de Anistia, Santos aderiu à greve da categoria metalúrgica por 83% de aumento salarial.

Alguns dias após o início da reivindicação, quando tentava negociar a libertação dos companheiros presos, foi atingido pelas costas por um policial. Após o episódio, Santos Dias tornou-se um símbolo de luta e resistência contra a repressão política.

O Movimento Negro não escapou da perseguição da ditadura, por conta das suas manifestações de cunho racial. Os militares conseguiram distorcer o mito da democracia racial a seu favor e tacharam os militantes de impatrióticos, racistas e imitadores dos ativistas norte-americanos (que lutavam pelos direitos civis).

O movimento acabou esmagado, assim como todas as lutas ditas “identitárias”, como a questão da mulher também. A luta ideológica esquerda contra direita, proletário contra burguês, se sobrepunha a todas as demais. “A esquerda brasileira, neste período, não considerou a questão de raça um elemento central em sua resistência, em sua ideia de construção de um país democrático. A luta de classes sempre foi o eixo central. Hoje, muitos historiadores dizem que o racismo, a herança dos quase 400 anos de escravidão vai se resolver no contexto das transformações sociais necessárias. Isso é um engano que a esquerda brasileira precisa resolver. É preciso compreender que apesar da questão de classe ser a frente para a luta anticapitalista, a questão racial não pode ocupar uma posição lateral, não pode ficar à margem. O Brasil foi o último a abolir a escravidão, foi o pais que mais sequestrou negros da África, é o país onde a abolição não representou a inclusão da população negra”, avalia Dojival.

 

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