Thalles Roberto e a juventude negra e evangélica
Na edição 177 confira em nossa matéria de capa o Cantor Gospel Thalles Roberto, um dos grandes nomes da juventude negra e evangélica em entrevista à Raça
TEXTO: Claudia Canto | FOTOS: Marcus Castro | Adaptação web: David Pereira
Fomos até o Rio de Janeiro, mais especificamente ao aeroporto Santos Dumont, encontrar Thalles Roberto, um dos cantores mais reconhecidos atualmente no cenário da música gospel. Nossa entrevista aconteceu no carro a caminho do Projac, onde ele iria gravar uma participação no programa Esquenta, apresentado por Regina Casé.
Thalles contou tudo de “coração aberto”, como gosta de dizer. Ao fundo, suas composições davam ritmo a sua narrativa eloquente e impactante. Confesso que fiquei surpresa: o conteúdo de suas palavras, aliado a sua expressividade no olhar, intrigaria até o mais cético telespectador. Em três anos de carreira na música gospel, o mineiro já conta com 600 mil discos vendidos. Se voltarmos no tempo por alguns anos, lembraremos dele quandoainda integrava a banda Jota Quest, ou então como vocalista do Jammil e Uma Noites.
Nascido em Passos, cidade do interior de Minas Gerais, Thalles Roberto da Silva é o caçula de quatro irmãos de um lar cristão, cercado por música black e muita religiosidade. Hoje, casado e pai de dois filhos, o cantor e pastor evangélico nem pensa em voltar a cantar música secular, mesmo dizendo que aprendeu muito no período em quedividia o palco com os variados músicos dos quais foi parceiro.
Apesar da agenda lotada de shows e de uma carreira internacional cada vez mais produtiva, Thalles recebeu a RAÇA Brasil de forma muito atenciosa, em uma entrevista que mais pareceu um testemunho. A seguir, confira trechos da entrevista com o cantor gospel Thalles Roberto.
Como é sua raiz musical, de onde tira suas inspirações para compor?
Vem toda da minha família, do que os meus irmãos ouviam em casa: Lionel Ritchie, Stevie Wonder, Michael Jackson, Diana Ross, Gilberto Gil, só música negra norte-americana de qualidade. Samba antigo brasileiro, como Bebeto e Paulo Diniz. Meu pai era pastor da Igreja Pentecostal. Só tinha um pandeiro para cantar. Então cresci com o som do pandeiro na cabeça. Só muito tempo depois que ele comprou guitarra e baixo para a banda da igreja. Quando me mostraram o rock, achei muito estranho, agressivo demais. Não entendia nada que eles cantavam, porque eu não conhecia. Logo perguntei se não tinha rock de negão? Foidaí que conheci Jimi Hendrix, Lenny Kravitz e outros. Comecei a ver que existiam outras coisas. Não gosto de músicas fabricadas: vamos fazer assim, que assim vende! Eu acho que vende porque é coração, porque é verdade. Componho em todos os lugares, vem na cabeça, e começo a cantar, rapidamente ligo o gravador. Nas festas, nas ruas.
Como aconteceu este momento de transição?
Estava em turnê em Curitiba (PR). Fiquei três dias me drogando, muita loucura. No terceiro dia não aguentava mais beber nem usar outras drogas. O corpo não aceitava mais, mas eu queria, insistia. O corpo falava: você vai morrer se continuar! Mas eu não escutava. Queria acelerar mais e mais. Pensava: vamos ver se a máquina segura! Quando estava no auge da loucura, resolvi fumar um cigarro de maconha para relaxar, voltar da loucura extrema. Foi neste momento que meu amigo falou: ‘vamos fumar, porque vamos todos para o inferno!’ Quando ouvi aquelas palavras, imediatamente comecei a pensar em tudo que estava acontecendo.
Sabemos que o período de desintoxicação é muito complicado, nos conte como aconteceu com você?
Quando comecei a me conscientizar, fui buscar ajuda. Só que procurei quem me conhecia na essência. Quando você procura pessoas que sabem quem você é, fica muito mais fácil. Fui atrás do pastor Antônio, um homem muito consciente. Ele disse: “Esse é o caminho, vou ajudar, orar por você. Mas a oração tem que ter ação. Você tem que caminhar, fazer a sua parte.”
E como foi esta caminhada?
Fui diminuindo a droga, e também a sua potencialidade, deixei de lado as drogas fortes. Até que chegou um dia em que comecei a ler a Bíblia e fumar maconha ao mesmo tempo, isto significava que eu estava melhorando. Eu lia a Bíblia e pensava: se isso tudo for verdade, vou ter que ficar careta mesmo, não tem jeito. Fiquei nesse ciclo algum tempo. Na época estava fazendo show com o Jammil. A droga favorece demais, dá um “up”, te pega e leva para o andar de cima.
Quando você mudou o estilo, sofreu preconceito por parte dos fãs?
Dentro do Jota Quest, eu tinha uns blogs dos fãs que me acompanhavam por causa de minhas loucuras. E também porque gosto de gente, do povo. Os fãs percebiam isto e me apoiavam.Quando resolvi sair, falei para eles: Gente, agora sou de Deus, entreguei minha vida a ele. Muitos me desejaram boa sorte. Outros me chamavam de burro: ‘você vai deixar uma banda que faz sucesso, para ir tocar nas igrejas?’ Aos olhos normais do homem, parece que você é louco. Mas aos olhos da fé, eu sabia que ia dar tudo certo. Eu não sabia quando nem como, mas eu tinha fé!
O que falaria para os jovens negros que se inspiram no seu trabalho?
Acho interessante que eles vejam um negrão bem-sucedido, que conseguiu superar barreiras e vencer. Você não precisa ser do mundo para ser pop. Deus era popular. Que eles não se sintam diferentes. Se Deus nos pintou desta cor, é porque Ele olhou de cima e achou interessante misturar. Uma roupa de uma cor só não chama tanta atenção, não tem graça.
Quer ver essa e outras entrevistas e reportagens da revista? Compre essa edição número 177.